Acórdão do TST após recurso da denunciada – MG

Número Único: 01461-2002-000-03-00-3
Tribunal Regional do Trabalho da Terceira Região
Processo: Ra – 17/02
Data De Publicação: 17/01/2003
Órgão Julgador: Órgão Especial
Juiz Relator: Exmo. Juiz Manuel Candido Rodrigues

Recorrente:Wagner Pereira Prado da Silva
Recorrido: Exmo. Juiz Presidente Do Trt – 3a. Região

Ementa:
Verdade Metafísica – Verdade Física – Verdade Processual – Conquanto se torne paradoxal a existência dessas três espécies de verdade, o certo é que a própria filosofia e o direito como tais as admitem sendo certo, embora, que tanto a física, quanto a processual, são sempre medianeiras da metafísica (a única que, a rigor, por ser indestrutível, como tal pode ser considerada). No campo dos julgamentos, a verdade processual, ainda quando porventura não manifeste a metafísica, a esta se equipara, apenas, para efeito de segurança, na prática dos atos processuais. De qualquer forma, “a verdade é uma força nascida em qualquer parte e que, atravessando corações e espíritos, se projeta nos documentos e livros; é uma força que agita os tribunais e parlamentos, constrói e reconstrói estados, derruba e varre poderes; é uma força que penetra, invisível, nos templos, alcança os campanários, ganha espaços inatingíveis, e, em pleno zenit, domina os páramos indevassáveis”
(Gilberto Vidigal).

Vistos, relatados e discutidos os presentes autos, em que figuram, como Recorrente, Wagner Pereira Prado da Silva e, como Recorrido, o Exmo. Juiz Presidente do TRT da 3a. Região.

I – Relatório

Wagner Pereira Prado da Silva, qualificado no processo em epígrafe, apresenta Recurso Administrativo contra a pena de advertência que lhe foi imposta, à fl. 415, aduzindo, para tanto, que “está respondendo, como indiciado, em verdade, por tentar reagir a um assédio moral” pois que, na verdade, tal pena já lhe foi aplicada, de forma cumulativa, com a de censura, pelo próprio Diretor de Secretaria, com a concordância e apoio formal e direto da juíza da própria Vara na qual se encontra lotado; sustenta esta alegação no teor da “promoção” feita pelo diretor de secretaria, no Proc. 2676/01, “in litteris”: “verifica-se que houve desobediência pelo referido servidor às normas legais, provimentais e ao plano de trabalho/2002 traçado aos Oficiais de Justiça desta Unidade”; no caso, houve uma evidente indução em erro para aplicação da pena aqui recorrida; a Comissão designada para proceder ao exame e conclusão dos fatos imputados ao recorrente não procedeu, adequadamente, para emitir o “Parecer”, em que se funda a pena aplicada ao recorrente; este “juntou ao feito certidão comprovando que até o dia anterior ao da vigência do Provimento 05, de 24/09/2001, o Sr. Diretor de Secretaria da Vara de Pouso Alegre certificava estar ele absolutamente em dia com todas as suas obrigações”; “se o Diretor de Secretaria de Pouso Alegre decide de forma diferente daquela contida no Provimento do juiz Corregedor, é evidente que devem ser eles harmonizados no sentido de se aplicar este nos aspectos de conflito com aquele”; o recorrente agiu de acordo com o Provimento da Corregedoria, em vigor sendo que o mais deve ser debitado a “abuso de autoridade” do Diretor de Secretaria da Vara de Pouso Alegre, numa inexplicável atitude de “execração pública do recorrente, fazendo constar de reclamatórias entre partes, que discutem temas outros que não os “interna corporis”, antes mesmo do exercício do direito de defesa do servidor, reprimendas e advertências contra quem, futuramente, é processado apenas para ter tal pena já aplicada meramente homologada, como se processo servisse para este fim e não para aqueles que todos que oficiam no Judiciário bem o sabem”.

Requer o cancelamento e revogações de todas as medidas paralelas de penalizações, em face do “império da antipatia documentada no Ofício 889/A-02, em desfavor do recorrente, por parte da juíza titular Camila Guimarães e do diretor de secretaria José Henrique da Paixão Lisboa, praticando todos os atos possíveis no sentido de afastar o recorrente do convívio com o seu filho, o que não conseguiu fazer a sua ex-esposa, Marília, lotada naquela mesma Vara na companhia de seu irmão, também lá lotado a exercer funções de assessoria da julgadora quando no exercício do cargo para oficial de justiça estava designado”.

Pede, sobretudo, que, através de um exame isento dos fatos, se dê provimento ao presente recurso.

Este, em síntese, é o relatório.

II – Voto

1 – Do conhecimento do recurso

Conheço do presente recurso, enquanto que se encontra em conformidade com as exigências legais.

2 – Do “meritum causae”

§ A – Considerações preliminares

Superados, embora, os graves equívocos e atropelos verificados, neste processo e que vão desde o tratamento de réu (impropriamente dispensado, originalmente, a um simples denunciado e, por fim, a um mero indiciado), passando pela inexplicável nomeação de um defensor dativo (fls. 387 vol. III), em favor de quem, administrativamente processado, já constava com advogado regularmente constituído (ata de fl. 142 vol. I), culminando com a inexplicável oitiva do próprio denunciante, como testemunha (fls. 130 e 139/142 vol I) -, o certo é que a delicadeza daquele consiste menos em tais aspectos da ordem formal e mais nas polêmicas e enigmáticas razões que tentam justificá-lo (e, por conseqüência, através dele, instrumentalizar quanto nele abertamente sobressai: de imediato, destituir o indiciado de seu cargo de Oficial de Justiça “ad hoc” e, por fim, afastá-lo, definitiva e terminantemente, da Vara do Trabalho de Pouso Alegre, onde se encontrava lotado (ofício de fls. 72, conjuntamente assinado pela Juíza titular da própria Vara e pelo seu diretor de secretaria o último, conforme evidenciado, em todas as páginas dos autos, autor deste processo e do que, precedentemente, pelo mesmo foi aberto, junto da Corregedoria Regional, também contra o recorrente).

A esta altura, cumpre destacar que, conquanto a questão aqui controvertida ainda se encontre “sub judice”, conclui-se pelo histórico do processo que, na prática, aquele objetivo já foi alcançado restando-nos saber, então, até que ponto essa precipitação de fatos, aqui atacados, pelo recorrente, afinal, devem ou não ser ratificados por este sodalício.

Por isso mesmo é que, diante da decisão que embasa as penas aplicadas ao recorrente (de fls. 405 a 413 vol. III), da autoria de uma Comissão de funcionários, para tanto designada, agora que o recorrente retoma sua defesa, perante este Colegiado (segundo o mesmo, não só para que sejam anuladas as penas sofridas, mas, também, para que na condição de funcionário, com mais de vinte anos de carreira, “o Diretor de Secretaria seja compelido a se retratar de todas as promoções feitas em desfavor do Indiciado, de forma expressa e pública” e, “além disso, que lhe seja prontamente restabelecida a função comissionada FC 05 (defesa de fls. 403/404) reforçando, neste recurso, ainda, “in litteris”, que “requer, ainda, que sejam canceladas e revogadas todas as medidas paralelas de penalização do recorrente, tais como remoção ou lotações em locais outros que não em Pouso Alegre, já que isto ocorre na espécie e há, sim, império da antipatia Documentada no Ofício 889/A 02, em desfavor do recorrente, por parte da Juíza titular Camila Guimarães e do Diretor de Secretaria José Henrique da Paixão Lisboa, praticando todos os atos possíveis no sentido de se afastar o recorrente do convívio com o seu filho, o que não conseguiu fazer a sua ex-esposa, Marília, lotada naquela mesma Vara na companhia de seu irmão, também lá lotado e a exercer as funções de assessoria da julgadora quando no exercício do cargo para Oficial de Justiça estava designado” – (fl. 421), resta-nos concluir, afinal, a verdade processualmente estampada neste processo.

§ B – Quanto ao mérito, propriamente dito

Abstendo-nos, desde logo, de tecer quaisquer considerações sobre o aspecto impressivo do processo desde que, embora formalmente representado por três volumes, aparenta tratar-se de abundante material de sua instrução -, o certo é que, feito o seu cuidadoso manuseio, facilmente se conclui que tanto resulta mais da inexplicável multiplicação de repetidas cópias documentais, sem outro mérito senão o de concorrer para a suprema dificuldade em distinguir o que representa contribuição de prova, daquilo que a obscurece.

De qualquer forma, partindo-se da natureza da denúncia, originalmente feita, contra o indiciado de que o mesmo, como oficial de justiça “ad hoc”, foi negligente, no cumprimento dos mandados judiciais que lhe foram distribuídos -, desde que no exercício de uma função precária e comissionada, indaga-se, até que ponto, em nome e benefício da própria economia processual, não teria sido bem mais fácil proceder-se à destituição “ad nutum” daquele (evitando-se, assim, o profundo desgaste sempre causado por processos desta natureza).

Por outro lado e, ainda, no plano indagativo -, deparamo-nos com a seguinte e delicada questão, no plano da lealdade processual: uma vez que este processo foi instaurado, em 08/04/02 (conforme reza a promoção da fl. 60 Vol. I), tendo contado, anteriormente, com outro processo correicional, com igual finalidade, aberto pelo mesmo denunciante (no caso, o diretor de Secretaria da Vara de Pouso Alegre), e no qual consta, atestado pelo mesmo, junto da Corregedoria Regional, que o denunciado “deixou de cumprir diversos mandados sem causa justificada, inclusive não se dirigindo às cidades de Bom Repouso e Itapeva, localidades onde devia diligenciar” (teor da denúncia da fl. 165 vol. II), tanto suscita, no caso, os seguintes questionamentos:

a) Que razões teriam levado o denunciante a não atender o pedido de expedição de certidão, prontamente requerida pelo denunciado, sobre o seu desempenho funcional, para fins de produção de sua defesa, junto da Corregedoria enquanto que, a toda a evidência, as expressas na Certidão da fl. 287 (Vol. II), datada de 17/09/2001, deveras se tornam incompreensíveis (sobremodo, porque, na condição de denunciante, certamente dispunha de todos os dados estatísticos a respeito até porque arrolados, como objeto da própria denúncia que assina, à fl. 166, como principal autor)?

b) Por outro lado, “contrario sensu”, como poder compreender-se que, desde que provocado pelo juiz Corregedor, em 11/12/2001 (fl. 365 vol. II), para “informar sobre o atual desempenho funcional do servidor” (denunciado), acusando o recebimento da ordem, em 17/12/01, logo no dia seguinte (18/12/01), tenha satisfeito o que, com igual dever, deixou de cumprir, para com o denunciado, desde 17/09/2001?

Pior que o atraso no cumprimento de um dever imposto por lei, porém, mais difícil ainda se torna compreender o conteúdo do ofício/resposta pelo denunciante enviado ao Juiz Corregedor, aqui literalmente transcrito:

“Em resposta ao ofício no. 1524/2001, recebido em 17/12/01, venho informar a V. Exa. que o servidor, Wagner Pereira da Silva, vem cumprindo regularmente os mandados judiciais com dedicação, zelo, presteza e estrita observância aos prazos legais, nada havendo, no momento, que desabone sua conduta” (fl. 370 Vol. III).

Neste caso, partindo-se do pressuposto certo de que o denunciante, como servidor público ainda por cima, revestido do poder/dever inerente a um diretor de secretaria judicial, de sempre certificar a verdade -, jamais poderá prestar falsas informações a quem quer que as requeira (sobremodo, ao Juiz Corregedor, seu superior hierárquico), entre as duas versões contraditoriamente a este último dirigidas, conforme evidenciado no processo correicional, resta-nos saber qual delas, afinal, deve ser tida na conta de verdadeira a esta altura, ainda afastando a hipótese de que nenhuma delas como tal possa ser tomada.

Não bastasse a representação de tão dantesco quadro processual e outro, com motivos porventura ainda mais grotescos, se nos depara, neste processo: o denunciante, depois de ter prestado informações tão contraditórias ao próprio Juiz Corregedor, voltou à carga, contra o indiciado, com iguais acusações de descumprimento por aquele de prazos processuais só que, desta vez, com duas novidades dignas de nota: as denúncias passaram a ser dirigidas, diretamente, ao Exmo. Juiz Presidente do Tribunal, tendo como base de sustentação um “Plano de Trabalho dos Oficiais de Justiça”, de sua própria autoria, e pelo mesmo “promulgado”, em 07/02/2002, respeitante ao “período avaliativo de 31/10/2001 a 30/10/2002 (encontrado, inicialmente, às fls. 06/07 do processo e no qual consta um “de acordo” da Juíza titular da Vara).

Pelo visto, através deste “ato provisional”, o denunciante acabou pautando o “critério” de Avaliação dos Oficiais de Justiça neste processo, especificamente, transformado em ponto de apoio de todas as acusações promovidas contra o indiciado (e do que, por sua vez, inicialmente, decorreu a perda da função comissionada deste último, e a abertura deste processo disciplinar (fl. 60 vol. I).

Consumada, assim, a primeira pena decorrente da denúncia até aqui ainda controvertida.

Ao lado disto, nota-se, à fl. 73 (e, sobretudo, 80 Vol I) que o denunciante é autor de “Recomendações” dirigidas aos Oficiais de Justiça sendo que, na segunda, exclusivamente dirigida ao indiciado, em 21/11/2001 (contracenando, por sua vez, com o ofício dirigido ao Juiz Corregedor, em 18/12/01 fls. 370; Vol. III), naquelas “recomendando” ao denunciado que, “no recinto desta Secretaria, deverá se abster da prática de atos desta natureza e manter um comportamento urbano, sem tecer comentários dúbios e irônicos, evitando desta forma tumultuar o bom andamento dos trabalhos desta Unidade, sob pena de quebra da disciplina e da hierarquia”.

Pior: o teor do ofício dirigido ao Juiz Corregedor, encontrado à já citada fl. 370 (vol. III) atenta, frontalmente, contra o minucioso relatório produzido pelo próprio denunciante, em 22/08/2001, como peça de base de prova no processo correicional por ele movido contra o denunciado (fls.167/179 Vol III) que, diga-se de passagem (porém, sempre, em homenagem à verdade), acabou por contar com a parcial retificação do denunciante, através da fala produzida às fls. 361/364 (vol. III), datada de 05/11/2001, diante da defesa e documentos apresentados pelo denunciante, junto da própria Corregedoria!

A gravidade da situação estampada no processo, porém, não fica por aqui: sobressai, sobretudo, contra a Avaliação Funcional do denunciado, feita pelo denunciante e suas duas assistentes, (datada de 19/11/01, e autuada de fls. 76 a 78 – (Vol. I), com a seguinte agravante: no item 04 (da fl. 78 Vol. I), invoca-se, como “Justificativa de Avaliação”, a “conduta no período de 16/07/01 a 14/08/01 que ensejou a instauração do Processo Disciplinar TRT/SCR/169/01 junto à Corregedoria de Justiça (Pedido de Providências)”.

Precisamente, diante de tantas e tão graves contradições do denunciante (no caso, um diretor de secretaria de Vara, autor de denúncia, perante o seu próprio Juiz Corregedor posteriormente, contrariada, taxativamente, através do ofício da fl. 370), limitou-se este último a concluir, a respeito da Medida Correicional intentada, devidamente instruída – porém, ainda assim, sem desistência ou retratação do denunciante:

“Diante disso, não há providência alguma a ser tomada contra o Denunciado, tendo em vista que seu desempenho funcional no momento recebe os encômios do próprio denunciante” (fls. 372).

Isto, em 21/12/2001, relativamente a uma Medida Correicional protocolada, em 27/08/2001 (fls. 165) cujo curso, portanto, se processou, praticamente, por quatro meses.

Superado, aparentemente, este gravíssimo episódio, com a própria decisão correicional; gravíssimo inclusive, porque chegou a comprometer, indevidamente, a intervenção dos bons ofícios do próprio Juiz Corregedor -, surpreendentemente, voltou-se à carga, com iguais denúncias, contra o indiciado (desta vez, porém, conforme anteriormente ressaltado, tomando-se por encosto um “ato provisional” (? !), da autoria do próprio denunciante, baixado pouco mais de dois meses após a decisão correicional, – eis que, conforme já referido, é datado de 07/02/2002).

Precisamente, um mês após essa “instrução” do denunciante, de caráter tipicamente “regimental”, retomou-se uma seqüência de mais denúncias de descumprimento de prazos processuais, nas diligências de mandados judiciais só que, desta vez, não dirigidas ao Juiz Corregedor, porém, diretamente, ao Juiz Presidente do Tribunal (e, por outro lado, a maioria delas, assinadas por Juiz em exercício e, algumas, pela própria Juíza titular da Vara de Pouso Alegre todas elas, porém, movidas por promoções feitas em processos, da autoria do denunciante e de sua assistente Nilcéia esta, precisamente, a mesma que, com este último, também fez parte da Comissão de Avaliação do denunciado, encontrada à fl. 77 (Vol. I) do processo.

Enquanto que as mesmas acusações (de negligência funcional do denunciado, pelo descumprimento dos prazos judiciais), na Corregedoria, deram azo a um processo que perdurou de 27/08/2001 a 21/12/2001 (quatro meses, portanto), desta vez, porém, nota-se que o primeiro ofício/denúncia é datado de 08/03/2002 (fls. 02 Vol. I); e, mesmo sem qualquer consulta à Corregedoria, logo em 22/03/2002 (menos de quinze dias depois, por conseqüência), pelo Diretor-Geral do Tribunal foi proposta ao Juiz Presidente do Tribunal “a exclusão do servidor da função comissionada que ocupa e a instauração do competente Processo Administrativo Disciplinar, com o objetivo de promover a apuração da responsabilidade de Wagner Pereira Prado da Silva nos fatos narrados nos processos em epígrafe”.

Impressionado com esta última invocação (de “processos em epígrafe”), este relator, com certa dificuldade, acabou por concluir que, onde se lê “processos” deve ler-se ofícios (no caso, encontrados às fls. 02, 08, 15, 23 e 29 (do Vol. I), o primeiro dos quais, precisamente, datado de 08/03/02 – todos os cinco, portanto, longe de ser processos (não passando, por isso, de puras acusações meramente formais).

Certo mesmo, até aqui pelo que consta do processo -, é que o denunciado, sem o espaço legal do direito de defesa, e apenas em função dos cinco citados ofícios, perdeu sua função comissionada de Oficial de Justiça “ad hoc”.

Logo em seguida (em 11/04/02), em razão doutro ofício mais uma vez, também dirigido ao Juiz Presidente do Tribunal, conjuntamente, pela Juíza titular da Vara de Pouso Alegre e denunciante (fl. 72 Vol. I), ao argumento de “não ser do nosso interesse a continuidade da prestação de seus serviços (no caso, do indiciado) nesta Unidade e com o escopo de manter a boa ordem dos trabalhos da secretaria e a harmonia da equipe”, e que a “conduta de não observância das normas legais, provimentais e internas, sem justificativa formalizada, constitui, na verdade, um mau exemplo para os demais servidores, devendo, pois, ser repelida, sob pena de quebra de disciplina, da hierarquia e desagregações na equipe” (destacando, também, “ser impossível a sua permanência no serviço externo da secretaria”, e “inviável e inconveniente o mesmo exercer funções no âmbito interno da secretaria”; e salientando, por fim, que “sua ex-esposa e seu ex-cunhado trabalham também nesta secretaria internamente, cabendo frisar que a separação do casal foi litigiosa e que ainda persiste a discussão judicial sobre a partilha de bens”), tanto acabou resultando, logo a partir de 16/04/2001, no afastamento do cargo do denunciado, de acordo com os termos expressos na decisão da fl. 71 (vol I).

Pelo mesmo motivo da denúncia, foi imposta, assim, a segunda pena ao denunciado, de afastamento do exercício do cargo, por sessenta dias (Fl. 61 vol. I).

Instruído o processo, através de prova documental e testemunhal inclusive, com a inexplicável participação do denunciante, como testemunha , depois do compromisso deste “conforme a lei a dizer apenas a verdade”, e “que não é inimigo do réu”, nem “amigo da servidora Marília Vieira, ex-esposa do réu” (ata de fl. 139 vol. I), foi declarado que “confirma todas as promoções constantes nos autos assinadas por ele”; “que independentemente de pauta dupla, os mandados deveriam ser cumpridos no prazo legal (8 dias)”, e que “o sistema de pauta dupla está implantado naquela secretaria desde Fevereiro 2000, data em que o depoente assumiu a diretoria e em vigor até esta data” (fl. 140 Vol. I).

Na citada assentada, porém, acabou por referir aspectos deveras interessantes, para o esclarecimento deste intrincado caso: “que o réu recebeu a primeira recomendação pelo juiz presidente, feita em 20/02/2002” treze dias após, portanto, a “instrução” pelo próprio baixada e endereçada aos oficiais de justiça; “que todos os oficiais pedem dilação de prazo”; “que não pode afirmar com precisão se anteriormente ao plano de trabalho todos os oficiais cumpriam os prazos” o que, pelo menos no último caso, no mínimo, dá margem às seguintes indagações: se não sabe informar, quanto aos outros oficiais de justiça, sobre o cumprimento de mandados judiciais, como conseguiu sabê-lo, quanto ao por ele denunciado?

Por outro lado, se todos os oficiais pedem dilação de prazo, por que só o denunciado tinha que cumprir o prazo imposto pelo denunciante ainda que contra a faculdade do art. 8o., do Provimento no. 05, da Corregedoria Regional?

Mais: se, conforme assentado na ata de instrução deste processo (fl. 139 vol. I), juramentado, o denunciante ratificou “todas as promoções constantes nos autos assinados por ele”, contra o indiciado (isto em 05/07/2002), como explicar-se o teor do ofício da fl. 123 (vol. I), em resposta ao presidente da Comissão de Inquérito, em 12/06/2002, sobre recomendações feitas aos oficiais de justiça, constantes de atas correicionais, pelo mesmo assinado, e com a declaração de “que não houve qualquer recomendação por parte da Corregedoria, constante em ata correicional, relativa aos trabalhos desenvolvidos por todos os Oficiais de Justiça desta Secretaria, inclusive do Servidor Wagner Pereira Prado da Silva” (destacou-se)?

Afinal, se denúncias tinha a fazer, por dever de ofício, contra o denunciado, como compreender-se tamanha omissão, junto do Corregedor, nas próprias visitas correcionais, preferindo apresentá-las, diretamente, ao Juiz Presidente do Tribunal constituindo-se, assim, pela segunda vez, também, perante o último, em agente de graves e inexplicáveis contradições?

Para o indiciado, através da defesa que lhe foi propiciada pelo defensor dativo, à fl. 392 (Vol. III), “o que se pretende dizer é que, ou as acusações … estão equivocadas ou decorrem de perseguição”.

A propósito, deve salientar-se que, precisamente, através da defesa dativa de fls. 391/404 (Vol. III), numa específica e detalhada demonstração de dados fundamentais, de tal modo ficou demonstrado desta vez, junto da Comissão de Inquérito que eram inconsistentes as acusações agora feitas pelo denunciante, perante o Juiz Presidente do Tribunal que, no Relatório de Julgamento, textualmente, se reconhece: “Ao contrário do que afirma o defensor dativo (autos, f. 395/396) o indiciado excedeu o prazo legal/regulamentar para cumprimento do mandado 209/02. No que se refere aos demais processos, o procurador logrou êxito em comprovar que o indiciado cumpriu o seu munus” (fl. 411, in fine, Vol. III).

Resta-nos saber, neste caso, se tanto foi alcançado pelos outros quatro oficiais de justiça pois que, quanto a estes, nem o denunciante apresenta relatórios de confronto, no processo, muito menos a atribuição de avaliação de seu desempenho (o que, lamentável e inexplicavelmente, também não foi requisitado pela Comissão de Inquérito).

A dar-se crédito ao depoimento do Oficial de Justiça José Adelino Dantas, em seu depoimento de fl. 141, “não tem notícia sobre o descumprimento do plano de trabalho dos Oficiais por parte de nenhum deles” fazendo supor que, nesta declaração, também está incluído o indiciado. Disse mais: “que não recebeu do réu nenhum pedido de ajuda para cumprimento de mandados” (ata de fl. 141 Vol. III).

Mesmo assim, ainda que estampado no processo, à fl. 169 (Vol. II), que enquanto o denunciado cobria uma distância de 606 Km contra, apenas, 369, 349 e 465 dos demais; e reconhecido, pelo Oficial José Adelino Dantas, no depoimento prestado, perante a Comissão de Inquérito, “que todos os Oficiais cumprem mandados com carro próprio, que todas as áreas possuem trechos ruins de difícil acesso e que não se pode utilizar qualquer tipo de veículo dada a multiplicidade de tipos de caminhos, encontrados na região; que cumpria mandados na região de Monte Verde; que com a chegada do réu passou tal atribuição para o mesmo; que as estradas apresentam alto grau de dificuldade tal como para todo o restante da região; que ocorrência de períodos chuvosos aumenta ainda mais as dificuldades enfrentadas pelos Oficiais de Justiça” o certo é que nada disto foi levado em consideração, no julgamento daquele.

Diante, pois, do amontoado de contradições apresentadas pelo autor das denúncias (tanto junto do Juiz Corregedor, quanto do Juiz Presidente do Tribunal e da própria Comissão de Inquérito), incorreu esta em contradição, evidenciada na conclusão da fl. 412, de proposta de advertência do denunciado sobretudo, porque jamais a tal conclusão se poderia ter chegado, diante das considerações ali tecidas, tomando por base a existência de elogios na ficha funcional daquele e a constatação de descumprimento de prazo, de um único mandado judicial.

De qualquer forma, acabou por se consumar a pena de advertência do denunciado, conforme consta à fl. 414 (Vol. III), precedida da perda da função comissionada e de afastamento do próprio exercício de seu cargo o que, por sua vez, fez com que aquele, no recurso apresentado, chegue a afirmar que “a pena imposta na decisão de advertência, já foi aplicada, de forma cumulativa com a de censura, tudo aliado a uma espécie de execreção pública, tudo sob o império do exposto no item “a” – o assédio moral – o que permitiu ao Diretor de Secretaria praticar tais atos sob a concordância e apoio formal e Direto da Exma. Juíza daquela Vara, Dra. Camila” (fls. 419), e o que o leva a requerer, à fl. 421, inclusive, que “sejam canceladas e revogadas todas as medidas paralelas de penalização do recorrente, tais como remoções ou lotações em locais outros que não em Pouso Alegre, já que isto ocorre na espécie e há, sim, império da antipatia Documentada no Ofício 889/A 02 em desfavor do recorrente, por parte da Juíza Titular Camila Guimarães e do Diretor de Secretaria José Henrique da Paixão Lisboa, praticando todos os atos possíveis no sentido de afastar o recorrente do convívio com o seu filho, o que não conseguiu fazer a sua ex-esposa, Marília, lotada naquela mesma Vara na companhia de seu irmão, também lá lotado e a exercer funções de assessoria da julgadora quando no exercício de Cargo para Oficial de Justiça, estava designado”.

Por sua vez, em face da consulta pelo denunciado dirigida ao presidente da Comissão de Inquérito sobre seu destino, ao final do prazo de afastamento (fl.) e de vez que, por um lado, não pretende abandonar a carreira e, por outro, está impedido de voltar à Vara de Pouso Alegre -, notado que tal esclarecimento não se encontra nos autos, por este relator foi determinado a fl 431, que a tanto se procedem, acabou sendo informado, através da Certidão da fl 433, que aquele, atualmente, se encontra lotado na Diretoria do Serviço Administrativo (o que para nós acaba por significar que, além de ter perdido a lotação, em Pouso Alegre, ainda por cima dali foi removido).

Cinco punições, portanto, para a mesma falta imputada o que, portanto, além de atentar contra o sagrado princípio jurídico do “non bis in idem”, aqui atinge o extremo de atentar contra o mais grave do “non multidem”.

Só por isto, portanto, já razões sobrariam para anulação das penas injustamente aplicadas ao denunciado à exceção, evidentemente, daquela da perda de função comissionada de oficial de justiça “ad hoc” eis que, quanto a esta, em razão de sua própria natureza, até mesmo comporta a destituição, “ad nutum”, pelo Juiz Presidente do Tribunal.

Diante de tudo isto, o denunciante pede para que sejam anuladas estas e as demais penas por ele sofridas inclusive, a inexplicável “avaliação funcional” de fls. 76/78, feita pelo próprio denunciante, bem assim como todos os atos e moções que encontram no primeiro a autoria ou a cumplicidade.

Tal pedido decorre, necessariamente, da comprovada falta de isenção e de lealdade (funcional e processual) do denunciante, contra o indiciado, tanto nos julgamentos emitidos, quanto nas denúncias feitas e atos processualmente praticados, pelo primeiro, quer junto da Corregedoria Regional, quer perante o Presidente do Tribunal, quer mesmo diante da Comissão de Inquérito.

É que, em direito, tudo deve ser pautado pelo princípio da lealdade, ou mesmo da autoridade de que o agente eventualmente se reveste sempre no sentido de se evitar, quer o abuso de direito, quer o de autoridade (este último, segundo nos parece, ainda mais grave do que o primeiro).

Com efeito, conquanto de natureza analógica, em termos de gravidade, porém, o segundo acaba por sobrepor-se ao primeiro pois que se este se tipifica, simplesmente, pelo fato do titular do direito exceder-se, no seu uso, quanto aos limites que a este são impostos, tanto pelo seu fim econômico ou social, quanto pela boa-fé e pelos bons costumes (art. 187 do Novo Código Civil), certo se torna que, de outra parte, de qualquer forma, o agente considera-se revestido de uma legitimidade própria, a ponto de mais facilmente poder desculpá-lo no seu “modus agendi”.

Já o “abuso de autoridade”, por sua vez, além de partilhar dos mesmos e gravíssimos pecados, inerentes ao abuso de direito, deste se distingue, precisamente, enquanto que seu agente, não dispondo de uma legitimidade própria, mas delegada, no campo de sua atuação, ainda por cima indevidamente se serve da investidura num cargo ou função pública, que jamais poderá comportar desvios de conduta em regra, destinados a instrumentalizar objetivos pessoais daqueles que a tanto se arrogam (isto porque mais do que ao agente que de tanto usa, sobremodo, atinge a instituição em nome da qual se pratica).

Desde que a prova dos autos, globalmente considerada, faz concluir que a mesma acaba por beneficiar o denunciado, voltando-se contra o próprio denunciante, em face das gravíssimas contradições, através delas evidenciadas, relativamente aos atos praticados pelo segundo, no estrito cumprimento de seu delicado munus de chefe de secretaria judicial, – induzindo em erro, primeiramente, o Juiz Corregedor; em seguida, o Juiz Presidente do Tribunal e, por fim, a própria Comissão de Inquérito -, impõe-se-nos o dever de ofício de tanto dar ciência oficial aos dois primeiros, para os fins expressamente previstos em lei e absolvendo, por sua vez, o indiciado, das penas que lhe foram impostas, à exceção da perda da função comissionada de oficial de justiça “ad hoc”, enquanto esta comporta a destituição, inclusive, “ad nutum”.

Esta, para nós, a conclusão a que inexoravelmente se chega, através da verdade processual estampada nas páginas destes autos.

Por tais motivos,

Conheço do recurso e dou-lhe provimento parcial para, à exceção da perda da função comissionada de oficial de justiça “ad hoc”, cassar as demais penas e atos que atingiram o recorrente, nominadas na fundamentação deste voto.

Oficie-se aos Exmos. Juízes Presidente do Tribunal e Corregedor, quanto às atitudes processuais do denunciante contra o denunciado, para os fins previstos em lei.

FUNDAMENTOS PELOS QUAIS,

ACORDAM os Juízes do Tribunal Regional do Trabalho da Terceira Região, em sessão ordinária do Órgão Especial, à unanimidade de votos, em conhecer do recurso; no mérito, sem divergência, dar-lhe provimento parcial para, à exceção da perda da função comissionada de oficial de justiça “ad hoc”, cassar as demais penas e atos que atingiram o recorrente, nominados na fundamentação do voto, determinando sejam oficiados os Exmos. Juízes Presidente do Tribunal e Corregedor, quanto às atitudes processuais do denunciante contra o denunciado, para os fins previstos em lei.

Belo Horizonte, 06 de dezembro de 2002.

Márcio Ribeiro Do Valle
Presidente

Manuel Cândido Rodrigues
Relator

Íntegra do acórdão do Tribunal Superior do Trabalho

http://www.tst.gov.br

Seção administrativa

Tipo: RMA – Número: 1461 – Ano: 2002
PROC. Nº TST-RMA – 1461/2002-000-03-00.3
C:

Acórdão seção administrativa

JOD/lhp/lm

Recurso. Matéria Administrativa. Servidor. Pena. Advertência. Cassação. Reexame. Impossibilidade.

1. O recurso em matéria administrativa para o Tribunal Superior do Trabalho, de conformidade com a Súmula nº 321, cabe estritamente para o controle de legalidade, não para o reexame da virtual injustiça da decisão, que supõe revolvimento de fatos e provas.
2. Incabível recurso em matéria administrativa para o Tribunal Superior do Trabalho objetivando restabelecer a imposição de penalidade de advertência imposta pelo Presidente do Tribunal Regional, mas cassada pelo Órgão Especial do Tribunal Regional a quo, bem assim o reconhecimento das justificativas da acenada conduta desidiosa do Servidor-denunciado.
3. Para se acatar semelhante postulação, imperioso proceder a detido exame dos motivos ensejadores do ato disciplinar e dos fatos apurados mediante processo disciplinar, o que refoge ao estrito controle de legalidade exercido pelo Tribunal Superior do Trabalho em matéria administrativa.
4. Recurso em matéria administrativa não conhecido, por incabível.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso em Matéria Administrativa nº TST-RMA-1461/2002-000-03-00.3, em que é Recorrente MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO DA 3ª região e são recorridos Wagner Pereira Prado Da Silva e TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO da 3ª região.

O presente procedimento administrativo inicia-se com a comunicação que fez o Exmo. Juiz do Trabalho da Vara de Pouso Alegre/MG, apontando comportamento desidioso do Servidor Wagner Pereira Prado da Silva, exercente da função de Oficial de Justiça ad hoc, ao não observar as normas de cumprimento de mandados judiciais (fls. 02/03).

Determinada a instauração de Processo Administrativo Disciplinar, por decisão publicada em 10/04/2002 (fl. 61).

O Exmo. Juiz Presidente do Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região, acolhendo, na íntegra, a conclusão constante dos autos do Processo Disciplinar, aplicou a pena administrativa de advertência ao Servidor-denunciado, em face da inobservância do disposto no art. 116, incisos I, III e IV, da Lei nº 8112/90.

Inconformado, interpôs o Servidor recurso para o Órgão Especial do TRT a quo. Em suas razões, sustentou que as acusações formuladas pelo Diretor de Secretaria da Vara do Trabalho de Pouso Alegre/MG não se justificariam, porquanto em anterior processo correicional, em que se alegava negligência no cumprimento dos mandados judiciais que lhe foram distribuídos, concluiu o Juiz-corregedor favoravelmente ao Denunciado, nos seguintes termos:

Diante disso, não há providência alguma a ser tomada contra o Denunciado, tendo em vista que seu desempenho funcional no momento recebe os encômios do próprio Denunciante. (fl. 372).

O Órgão Especial do Tribunal a quo conheceu do recurso e, no mérito, deu-lhe parcial provimento para, à exceção da perda da função comissionada de Oficial de Justiça ad hoc , cassar as demais penas e atos que atingiram o Recorrente (fls. 435/445).

Inconformado, o Ministério Público do Trabalho da 3ª Região interpõe recurso ordinário em matéria administrativa, sustentando que a Administração Pública tem o dever de promover a apuração de irregularidades imputadas a servidor. Argumenta o Recorrente que a prova dos autos evidencia o comportamento desidioso do Servidor, ora Recorrido, diante dos fatos comunicados pelo Exmo. Juiz Presidente da Vara do Trabalho de Pouso Alegre/MG ao então Juiz Presidente do TRT da 3ª Região, mediante os ofícios 494/02, 493/02, 502/02, 503/02, 653/02 e 682/02 (fls. 454/467).

Contra-razões às fls. 473/490.

Os autos não foram remetidos à d. Procuradoria-Geral do Trabalho.

É o relatório.

1. Conhecimento do recurso
1.1. Reexame do mérito da cassação da pena de advertência

O Servidor Wagner Pereira Prado da Silva, ora Recorrido, em contra-razões, suscita preliminar de não conhecimento do recurso, por não demonstrada a ilegalidade do ato.

Reputo fundada a preliminar, porquanto incabível o presente recurso em matéria administrativa no que tange ao reexame da conveniência e da oportunidade da aplicação da pena de advertência ao Servidor.

Como visto, o Recorrido foi advertido nos termos da seguinte decisão administrativa, de lavra do Exmo. Juiz Presidente do Eg. 3º Regional:

“Tendo em vista o que consta dos autos do Processo Administrativo Disciplinar em epígrafe, ACATO, na íntegra, o relatório apresentado pela comissão, para ADVERTIR o servidor Wagner Pereira Prado da Silva, Analista Judiciário, Matrícula 30833404, em face da inobservância do disposto no art. 116, inciso I, III e IV da Lei nº 8112/90.

Encaminhem-se cópias do Relatório e da presente decisão à Diretoria da Secretaria de Coordenação Administrativa, para a adoção das providências pertinentes à sua área de atuação, fazendo-se comunicar à Diretoria da Secretaria de Pessoal para fins de registro nos assentamentos funcionais, observado o disposto no art. 131 da Lei nº 8112/90.

Oficiem-se ao denunciado, à MM. Juíza Titular da Vara do Trabalho de Pouso Alegre e ao Diretor de Secretaria, dando-lhes ciência do Relatório da Comissão de Disciplina e da presente decisão.

Ultimadas essas providências, retorne-se o processo à Diretoria-Geral, para o arquivamento provisório. (fl. 414).

Inconformado, interpôs o Servidor-denunciado recurso para o Órgão Especial do TRT a quo. Em suas razões, sustentou que as acusações formuladas pelo Diretor de Secretaria da Vara do Trabalho de Pouso Alegre/MG não se justificariam, porquanto em anterior processo correicional, em que se alegava negligência no cumprimento dos mandados judiciais que lhe foram distribuídos, concluiu o Juiz-corregedor favoravelmente ao Denunciado.”

O Órgão Especial do Tribunal a quo conheceu do recurso e, no mérito, deu-lhe parcial provimento para, à exceção da perda da função comissionada de oficial de justiça ad hoc, cassar as demais penas e atos que atingiram o Recorrente (fls. 435/445).

As razões de decidir do v. acórdão encontram-se vazadas nos seguintes termos:

“Desde que a prova dos autos, globalmente considerada, faz concluir que a mesma acaba de beneficiar o denunciado, voltando-se contra o próprio denunciante, em face das gravíssimas contradições, através delas evidenciadas, relativamente aos atos praticados pelo segundo, no estrito cumprimento de seu delicado munus de chefe de secretaria judicial induzindo em erro, primeiramente, o Juiz Corregedor; em seguida, o Juiz Presidente do Tribunal e, por fim, a própria Comissão de Inquérito -, impõe-se-nos o dever de ofício de tanto dar ciência oficial aos dois primeiros, para os fins expressamente previstos em lei e absolvendo, por sua vez, o indiciado, das penas que lhe foram impostas, à exceção da perda da função comissionada de oficial de justiça ad hoc, enquanto esta comporta a destituição, inclusive, ad nutum.

Esta, para nós, a conclusão a que inexoravelmente se chega, através da verdade processual estampada nas páginas destes autos.

Por tais motivos, conheço do recurso e dou-lhe provimento parcial para, à exceção da perda da função comissionada de oficial de justiça ad hoc, cassar as demais penas e atos que atingiram o recorrente, nominados na fundamentação deste voto.” (fl. 445).

Inconformado, o Ministério Público do Trabalho da 3ª Região interpõe recurso ordinário em matéria administrativa, pretendendo a reanálise do conjunto fático-probatório, de modo a rediscutir os motivos justificadores das apontadas irregularidades imputadas ao servidor. Argumenta o Recorrente que a prova dos autos evidencia o comportamento desidioso do Servidor, ora Recorrido, diante dos fatos comunicados pelo Exmo. Juiz Presidente da Vara do Trabalho de Pouso Alegre/MG ao então Juiz Presidente do TRT da 3ª Região mediante os ofícios 494/02, 493/02, 502/02, 503/02, 653/02 e 682/02 (fls. 454/467).

A Súmula nº 321 do Eg. TST sedimentou o seguinte entendimento:

“Nº 321. Decisão administrativa. Recurso. Revisão do Enunciado nº 302. Das decisões proferidas pelos Tribunais Regionais, em processo administrativo, cabe recurso para o Tribunal Superior do Trabalho tão-somente para exame da legalidade do ato. (Res. 13/1993, DJ 29-11-1993)”.

Vale relembrar a propósito a lição do Ministro CARLOS MÁRIO DA SILVA VELLOSO:

“Denuncia-se a ilegalidade pela inexistência de motivo e por resultado atentatório à norma legal.

A legitimidade do ato disciplinar como espécie do gênero ato administrativo, define-se em função de seus cinco elementos constituintes: a competência do sujeito ativo em face do sujeito passivo; o motivo; o objeto; a finalidade e a forma. A Lei 4.717, de 1965, ao regulamentar a disposição constitucional sobre os atos administrativos patrimoniais, conceituou as nulidades em razão de cada elemento que pela sua generalidade, aplica-se a toda atividade administrativa, inclusive a disciplinar. De acordo com o art. 2º, parágrafo único:

a) a incompetência fica caracterizada quando o ato não se incluir nas atribuições legais do agente que o praticou;
b) o vício de forma consiste na omissão ou na observância incompleta ou irregular de formalidades indispensáveis à existência ou seriedade do ato;
c) a ilegalidade do objeto ocorre quando o resultado do ato importa em violação de lei, regulamento ou outro ato normativo;
d) a inexistência dos motivos se verifica quando a matéria de fato ou de direito em que se fundamenta o ato, é materialmente inexistente ou juridicamente inadequada ao resultado obtido;
e) o desvio de finalidade se verifica quando o agente pratica o ato visando o fim diverso daquele previsto, explícita ou implicitamente, na regra de competência.’

Basta, pois, a falta ou defeito indissociável em um dos cinco elementos para contaminar todo ato administrativo.” (Mandado de Segurança; RDP/55-56, pág. 343).

Na espécie, partindo desses pressupostos, verifica-se que a intenção do Recorrente não é propriamente controle da legalidade.

Pretende o Recorrente o reconhecimento das irregularidades apontadas no tocante à acenada conduta desidiosa do Servidor-denunciado e, conseqüentemente, restabelecer a punição a ele aplicada por força da decisão proferida pelo Exmo. Juiz Presidente do Tribunal Regional (fl. 414). Inegável que o Recorrente busca, mediante o presente recurso ordinário em matéria administrativa, novo exame dos fatos motivadores do ato disciplinar, com o cotejo da prova, inclusive, pugnando pela justiça da pena de advertência aplicada anteriormente pelo Exmo. Juiz Presidente do TRT.

Sucede que, para se acatar semelhante postulação, imperioso proceder a detido exame dos motivos ensejadores do ato disciplinar e dos fatos apurados mediante processo disciplinar, o que refoge ao estrito controle de legalidade exercido pelo Tribunal Superior do Trabalho em matéria administrativa.

À vista do exposto, acolho a preliminar de não conhecimento do recurso em matéria administrativa, por incabível, ante o óbice da Súmula nº 321 do Eg. TST.

Isto posto
ACORDAM os Ministros da Seção Administrativa do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade, prosseguindo no julgamento, acolher a preliminar argüida pelo Servidor-recorrido, em contra-razões, e não conhecer do Recurso, por incabível, em face do Enunciado 321 do TST.

Brasília, 23 de outubro de 2003.

João Oreste Dalazen

Ministro Relator

Nota à imprensa de Wagner Pereira Prado da Silva

Foi com grata satisfação que pude testemunhar, de perto, nos dias 25 de setembro e 23 de outubro de 2003, as sessões de meu julgamento perante a Egrégia Corte Administrativa do Colendo Tribunal Superior do Trabalho, em Brasília, Distrito Federal.

A decisão transitou em julgado no último dia 11 de fevereiro.

No dia 23 de outubro de 2003, aquele Superior Sodalício, sem divergências, ou seja, à unanimidade de votos dos Ex.mos. Srs. Ministros daquela Corte, decidiu por não conhecer do recurso interposto pelo Procurador-Chefe da Procuradoria Regional do Trabalho de Minas Gerais, por incabível, acolhendo o voto condutor do Ex.mo. Sr. Ministro João Oreste DALAZEN.

Deste último julgamento participaram os Ex.mos. Srs. Ministros Vantuil ABDALA, Vice-Presidente, no exercício da Presidência, Ministros RIDER Nogueira de Brito, José Luciano de CASTILHO PEREIRA, Milton de MOURA FRANÇA, João Oreste DALAZEN, Relator e a Ex.ma. Procuradora-Geral do Trabalho, Sandra Lia SIMÓN.

Tanto quanto ou mais que eu, saiu vitorioso no Colendo Tribunal Superior do Trabalho o próprio Egrégio Tribunal Regional do Trabalho da Terceira Região, entendido, neste particular, os Ex.mos. Juízes componentes do Órgão Especial daquele Sodalício, sem contar a irradiação desta decisão quanto à abordagem do tema central: ASSÉDIO MORAL MEDIANTE ABUSO DE AUTORIDADE.

As medidas judiciais em busca de penalização dos agentes públicos culpados serão encetadas de imediato.

Agradeço ao meu Sindicato – SITRAEMG -, nas pessoas da Diretoria Executiva, e, em especial, a S.S.a a Presidente, Sônia PÉRES, a Diretora Heloisa LOMÔNACO e a minha querida irmã, Elizabeth PRADO, pelo firme – inquebrantável mesmo – apoio. Estes agradecimentos são também extensivos a todos os colegas e aos amigos, os quais, ainda que discretamente, torceram pela finalização desta quadra difícil em minha vida pessoal, profissional e social. Não poderiam faltar os agradecimentos ao meu pai, Benedito e aos demais irmãos, Virgínia Maria, Ruy e Miriam e a todos os familiares. Faço Menções Honrosas os profissionais da Medicina: Drs. Sebastião JUPIAÇARA, Mauro SAPONARA, Sheila CAPISTRANO, Maria de Fátima ABDALLA, José Antonio TAKARA e José Maria FANUCHI, profissionais que ajudam-me sobremaneira nesta travessia. Dedico esta vitória a todos que ostensivamente torceram pelo resultado alcançado e àquelas outras tantas pessoas, as quais, mesmo que discretamente também o fizeram. Faço, porém, dedicações especialíssimas ao meu ilustre, culto e honrado Advogado, Laerti SIMÕES de Oliveira, da vetusta cidade de Muzambinho e ao PEDRO Vieira Prado da Silva, querido e amado filho, o qual, desta vez, com sete anos, também torceu pela minha vitória, emocionando-me muito ao contar-me que por ocasião de meu julgamento, agendado para as 13 horas, ele interrompera suas atividades escolares no Colégio São José para uma oração em favor do pai.

A alegria pelo desfecho do caso é intensa, desta feita como da anterior, por decisões unânimes, agora da mais alta Corte da Justiça do Trabalho, porque, se de um lado é definitiva – irrecorrível mesmo, em face de expressa disposição constitucional e de entendimento jurisprudencial do Excelso Supremo Tribunal Federal, de outro não foi objeto de novo recurso incabível por parte do Ministério Público do Trabalho.

De qualquer modo, é deveras sintomático que no meu caso o Recorrente, Ministério Público do Trabalho de Minas Gerais, defensor da Lei, tenha interposto recurso, mesmo ciente de expressa previsão legal proibitiva e inserida na CLT: artigo 678, inciso I, alínea “d”, item 1 e do entendimento jurisprudencial prevalente (Enunciado da Súmula n. 321, do Colendo Tribunal Superior do Trabalho), que vedam este tipo de artimanha processual.

De outra face, é importante destacar que num momento em que o Ministério Público do Trabalho da Bahia empreende ações contra a prática de atos de desrespeito aos Direitos Humanos, combatendo o Assédio Moral, é de pasmar que o de Minas Gerais aja na contra-mão da História, de um novo horizonte nas relações de trabalho, como ocorreu no meu caso.

O Ministério Público do Trabalho de Minas Gerais, a partir de agora – e eu mesmo passarei a verificar se tal Instituição estará participando, na cognição, desde a instauração, dos Inquéritos Administrativos abertos no âmbito do Judiciário Federal Trabalhista com jurisdição em Minas Gerais – precisa atentar que em matéria processual não é possível ir “à la recherce du temps perdù”, literariamente sugerido por Proust, isto é, ou se pratica o ato no momento certo ou não se pratica mais, sendo vedadas vias indiretas para se atingir objetivos inacessíveis ante a barreira intransponível da preclusão. Ademais, o Colendo Tribunal Superior do Trabalho, na respeitável decisão, não vislumbrou qualquer ilegalidade na veneranda decisão Regional, que ensejasse o conhecimento do apelo ministerial.

Vê-se, pois, que a legislação processual, dentro ou mesmo fora do contexto da Reforma do Poder Judiciário, deve ser alterada com a brevidade de tempo possível, eliminando recursos incabíveis e desnecessários e que visam apenas protrair a execução dos julgados.

Ressalto, ainda, a minha excelente impressão quanto aos trabalhos dos Ex.mos. Srs. Ministros do Colendo Tribunal Superior do Trabalho, nas duas sessões onde o processo esteve em pauta, momentos em que pude testemunhar de perto partes de julgamentos anteriores e posteriores à sessão de meu próprio julgamento.

Vi e senti que S. Ex.as., nos debates orais travados sobre os casos concretos, em pauta de julgamento, demonstraram, todos eles, um amplo conhecimento das questões atinentes aos processos, inclusive de detalhes, demonstrando com isto que não delegam atribuições constitucionais suas a Servidores da Casa. Então, diferentemente de alguns Juízes, S. Exas., os Srs. Ministros, realmente trabalham e dão exemplo a algumas Instâncias inferiores do Judiciário Trabalhista.

A minha esperança é a de que o caso esteja esgotado, sem outras protelações e com a execução do venerando Acórdão Regional, mantido que foi na íntegra, tudo isto para que, parafraseando e na feliz acepção de meu ex-professor, o nobre, honrado, digno e exemplo de Juiz, Luiz Otávio Linhares RENAULT: “…diante de um capitalismo cada dia mais avassalador, o Direito do Trabalho não seja encarado como o direito das essências, mas sim das existências…”.

Wagner Pereira Prado da Silva – março de 2004

Empresa condenada por assédio moral no trabalho

Rio Grande do Sul: Lloyds Tsk Bank e Losango Promotora de Vendas condenados pela prática de assédio moral no trabalho

Área trabalhista: empresa condenada por assédio moral no trabalho

Rio Grande do Sul: Lloyds Tsk Bank e Losango Promotora de Vendas condenados pela prática de assédio moral no trabalho

O Loyds Bank Tsk Bank, acionista majoritario (83,78% do capital ) da LOSANGO Promotora de Vendas é condenado pela Justica do Trabalho gaucha pela pratica de assédio moral no trabalho a indenização por danos morais.

“Conforme parâmetros postos pelo E. STJ, o valor da indenização por danos morais deve atender não apenas a reparação, mas também o critério pedagógico e o critério punitivo”. O valor da indenização foi fixado em 50.000 reais pela sentença.

Empresa: Losango Promotora de Vendas Ltda E Lloyds Tsb Bank Plc
Número do processo: 00967.013/00-3 (RO)
Juiz: Beatriz Zoratto Sanvicente
Data de Publicação: 09/06/2003
http://www.trt4.gov.br/

Ementa: Competência. Dano Moral.Cabe à Justiça do Trabalho, no exercício de sua competência constitucional, julgar e processar ação versando sobre o ressarcimento por dano moral ajuizada pela trabalhadora contra o seu empregador, por se tratar de uma controvérsia decorrente do liame empregatício havido entre os litigantes.

Dano Moral. Configura-se situação de assédio moral o constrangimento de subordinada a carinhos não solicitados e indesejados, no ambiente de trabalho, associado à cobranças públicas de regularização de situação financeira particular e dissociada da empresa. Valor. Conforme parâmetros postos pelo E. STJ, o valor da indenização por danos morais deve atender não apenas a reparação, mas também o critério pedagógico e o critério punitivo. Majoração para R$ 50.000,00.

Responsabilidade Subsidiária. Nos termos do contrato social da primeira reclamada, o segundo réu é seu acionista majoritário, contando com aproximadamente 83,78% das cotas-parte do capital social. Grupo econômico reconhecido. Efeitos meramente patrimoniais da responsabilização solidária. Mantém-se.

Aviso Prévio Proporcional.
A norma do artigo 7º, inciso XXI, da Constituição Federal não é auto-aplicável no tocante ao aviso prévio proporcional ao tempo de serviço. Orientação do Enunciado 6 deste Tribunal.

VISTOS e relatados estes autos de RECURSO ORDINÁRIO e RECURSO ADESIVO, interpostos de sentença da 13ª Vara do Trabalho de Porto Alegre, sendo recorrentes Losango Promotora de Vendas Ltda. e Lloyds Tsb Bank Plc e Janaína Pereira Cardoso, respectivamente, e recorridos os mesmos.

Recorrem ordinariamente os reclamados. Argüem, preliminarmente, a nulidade parcial do decisum por negativa de prestação jurisdicional. Alegam ser imperativa a discriminação da natureza jurídica das parcelas, sendo imperativo ao Juízo originário assim proceder, especialmente ante os termos da Lei 10.035/2000, conferindo nova redação ao § 3º do art. 832 da CLT. Aduzem a oposição de embargos de declaração sem, contudo, lograr o efetivo pronunciamento do Juízo. Requerem o retorno dos autos à origem para tal fim. Renovam preliminar de incompetência deste Juízo para processar e julgar reclamatória onde a reclamante postula indenização por dano moral, pois não versa sobre relação de emprego. Requerem a extinção do feito sem julgamento do mérito, na forma do art. 267, IV, do Código de Processo Civil. Sustentam ser indevida a condenação subsidiária do segundo reclamado. Alegam não ter restado demonstrado o fato de estar uma das empresas sujeita a controle ou direção da outra, restando inatendido um dos requisitos postos no § 2º do art. 2º da CLT, e tampouco o fato de não ter a primeira reclamada, Losango, idoneidade financeira suficiente para fazer frente a eventual condenação. Acenam com o fato de ter sido a primeira reclamada quem contratou a autora, assalariando-a e promovendo a rescisão contratual, restando totalmente injustificada a condenação, neste particular.

Quanto ao dano moral, asseveram ser contraditória a prova produzida no presente feito, reportando-se aos depoimentos das testemunhas. Aduzem não ter a testemunha Luciana Fernandes identificado quem Tarcísio teria atacado, alegando terem as testemunhas Nara de Fátima Lima Fortuna e Cristiane Medeiros prestado depoimentos vagos. Referem os depoimentos das testemunhas Maria Zemira Bernardes, alegando desconhecer ataques por parte de Tarcísio a funcionários da empresa, e de Alexandre Oliveira, alegando desconhecer prática de assédio sexual por Tarcísio às empregadas. Sustentam não consistir a atuação de Tarcísio, de beijar, agarrar e abraçar as funcionárias como assédio sexual, por não verificada a imposição da vontade de uma parte sobre a outra e tampouco a remanescência de seqüelas dolorosas, tampouco se enquadrando no art. 216-A do Código Penal, inserido pela Lei 10.224 de 15.05.2001. Asseveram inexistir prejuízo, razão de não ser devida qualquer indenização.

Sucessivamente, alegam excessiva a indenização fixada, em R$ 5.000,00, por desprovida de qualquer fundamento. Ponderam ter a reclamante trabalhado por quarto anos e três meses, recebendo, como última remuneração, R$ 435,06, consistindo referida indenização em 12 meses de salário da autora, verba de proporções supostamente absurdas. Quanto às horas extras, alegam restar extra petita a decisão, porquanto a autora veiculou pretensão específica, referente ao número inferior de horas laboradas, não se coadunando com o intervalo alegadamente não fruído. Requerem seja ajustada a condenação, de molde a se considerar os 35 minutos do intervalo fruído, acrescido de 30min da jornada compensatória para elidir a condenação em horas extras. Acenam com o disposto na prova oral, depoimento da testemunha Nara, no sentido de poder anotar todas as horas trabalhadas no livro. Sustentam ser equivocada a decisão quanto à devolução de descontos, porquanto referente aos vales fornecidos em janeiro, quando a autora ainda trabalhava para a primeira reclamada. Quanto à integração do prêmio performance, alegam ser descabida a integração nas parcelas deferidas pelo Juízo de origem, porquanto a parcela detém natureza aleatória, constituindo-se numa parcela de valor variável, adequando-se ao disposto no Enunciado 253 do E. TST, requerendo seja reformada a sentença para excluir os reflexos deferidos na origem. Aos depósitos de FGTS, asseveram ter restado a sentença totalmente divorciada do laudo contábil, porquanto o contador afirmou estarem corretos os depósitos, requerendo seja excluída da condenação a parcela, já saldada. Quanto à multa indenizatória de 40% sobre os depósitos do FGTS, aduzem ter concluído o contador serem devidos R$ 8,18, nos termos do quesito 1.4. da autora e do quesito 12 dos reclamados, requerendo a limitação da condenação nos termos do laudo contábil.

A reclamante interpõe recurso adesivo, destrancado por agravo de instrumento em apenso. Requer a majoração do valor da indenização por danos morais, em razão da proporção do dano sofrido e também por conta do caráter pedagógico da medida. Postula, ainda, sejam declarados inválidos os controles de horário, sendo considerada confessa a primeira reclamada quanto a esse aspecto e acolhida a jornada declinada na inicial, em razão da existência de controle paralelo, situação demonstrada mediante prova oral. Pede seja considerada como extraordinário o labor excedente à oitava hora diária, porquanto a norma coletiva apenas prevê a possibilidade de adoção de jornada compensatória, sem a impor. Reporta-se à defesa da primeira reclamada, alegando não ser adotado regime compensatório. Pede a condenação dos reclamados ao pagamento de honorários advocatícios, alegando não ser monopólio dos sindicatos profissionais a assistência judiciária. Requer seja deferido aviso prévio proporcional, na forma do Precedente 13 deste Tribunal. Postula não sejam autorizados os descontos previdenciários e fiscais, porque serão efetuados a maior em razão de não terem os reclamados pago as parcelas devidas nas épocas próprias.

Ambos os litigantes apresentam contra-razões.
Prazos e preparo aos moldes legais.
Sobem os autos a este Tribunal.
É o relatório.

Isto Posto:


PRELIMINARMENTE.

1. Contra-Razões. Protocolo. Conhecimento.

A petição de interposição das contra-razões de recurso, apresentadas pela reclamante, não traz protocolo lançado. Foi juntada ao presente feito, sem passar por juízo prévio de admissibilidade no primeiro grau. A certidão da fl. 541 consigna: “Certifico que, por ocasião da juntada do recurso ordinário da autora, fls. 470/480, petição protocolada em 30.11.01, foram encontradas, na contracapa, contra-razões da autora, ao RO da reclamada, petição esta sem protocolo. Certifico, ainda, que nesta data está sendo procedida a juntada da mencionada petição.” Conforme certidão de carga dos autos, fl. 529, estes saíram com o procurador Roberto Olszewski em 22.11.2001 e retornaram em 30.11.2001. A petição de interposição do recurso adesivo traz protocolo lançado em 30.11.2001, e aquela apresentando contra-razões de recurso, embora sem protocolo, consigna a mesma data da primeira, referente ao recurso adesivo, 27.11.2001. Ante os termos das certidões exaradas pela secretaria da 13ª Vara de Porto Alegre, e sabendo que o protocolo é centralizado nesse Foro, merecem conhecimento as contra-razões recursais, porquanto tudo indica terem sido atempadamente apresentadas, muito embora não consignem número de ordem de protocolo.

2. Nulidade. Negativa De Prestação Jurisdicional.

Os reclamados argüem a nulidade parcial do decisum por negativa de prestação jurisdicional. Alegam ser imperativa a discriminação da natureza jurídica das parcelas, sendo imperativo ao Juízo originário assim proceder, especialmente ante os termos da Lei 10.035/2000, conferindo nova redação ao § 3º do art. 832 da CLT. Aduzem a oposição de embargos de declaração sem, contudo, lograr o efetivo pronunciamento do Juízo. Requerem o retorno dos autos à origem para tal fim.

Sem razão.

A natureza jurídica das parcelas lhe é inerente. Não há necessidade de fixação expressa, uma a uma, de sua natureza. No caso, é evidente deterem natureza salarial as parcelas referentes às horas extras, depósitos de FGTS e integração do prêmio-performance, e indenizatória as demais, indenização por dano moral e aquelas referentes às devoluções, de descontos efetuados na rescisão, de passagens de ônibus. Ademais, as parcelas indenizatórias, que não são a regra na relação empregatícia, estão especificadas como tal, salvo o desconto do tíquete restaurante, efetuado na rescisão. Todavia, por se tratar de devolução de desconto, é evidente sua natureza indenizatória, por resultar em restituição, enquadrando-se como pagamento por perdas e danos.

Rejeita-se.

NO MÉRITO.

1. Dano Moral. Valor. (matéria comum a ambos os apelos)

Os reclamados asseveram ser contraditória a prova produzida no presente feito, reportando-se aos depoimentos das testemunhas. Aduzem não ter a testemunha Luciana Fernandes identificado quem Tarcísio teria atacado, alegando terem as testemunhas Nara de Fátima Lima Fortuna e Cristiane Medeiros prestado depoimentos vagos. Referem os depoimentos das testemunhas Maria Zemira Bernardes, alegando desconhecer ataques por parte de Tarcísio a funcionários da empresa, e de Alexandre Oliveira, alegando desconhecer prática de assédio sexual por Tarcísio às empregadas. Sustentam não consistir a atuação de Tarcísio, de beijar, agarrar e abraçar as funcionárias como assédio sexual, por não verificada a imposição da vontade de uma parte sobre a outra e tampouco a remanescência de seqüelas dolorosas, tampouco se enquadrando no art. 216-A do Código Penal, inserido pela Lei 10.224 de 15.05.2001. Asseveram inexistir prejuízo, razão de não ser devida qualquer indenização. Sucessivamente, alegam excessiva a indenização fixada, em R$ 5.000,00, por desprovida de qualquer fundamento. Ponderam ter a reclamante trabalhado por quarto anos e três meses, recebendo, como última remuneração, R$ 435,06, consistindo referida indenização em 12 meses de salário da autora, verba alegadamente de proporções absurdas.

A reclamante requer a majoração do valor da indenização por danos morais, em razão da proporção do dano sofrido e também por conta do caráter pedagógico da medida.

Tarcísio Bandeira, de beliscar, agarrar e beijar os subordinados do sexo feminino, fundamentando ter restado evidenciado o abuso da condição de subordinada da reclamante. Fixou a indenização devida em R$ 5.000,00.

1. Dano. Assédio moral
Em suma, sustentam os reclamados não ter restado comprovado o dano moral, quer pela inocorrência de atos tendentes a tanto, quer pela ausência de dano.
Sem razão.
A prova oral produzida no âmbito do feito permite concluir pela caracterização inequívoca de dano moral, na modalidade de assédio moral. A autora narra, na petição inicial, situação de pressão, desconforto e abuso, em razão da conduta de funcionário designado para ocupar o posto de gerente, sendo seu superior imediato, atuando de forma a constrangê-la, tanto fisicamente, forçando contatos indesejados, quanto socialmente, requerendo de forma pouco respeitosa a regularização de pendências junto à Sociedade de Proteção ao Crédito, SPC. Suas alegações restaram amplamente respaldadas na prova oral. Disse a testemunha Luciana Fernandes, fls. 479/480: “… quando a depoente tinha que comparecer à sala de Tarcísio, este vinha lhe beijar e agarrar, embora a depoente se sentisse mal com tal situação; que a depoente comentava esta situação com sua encarregada de setor, que lhe orientava a não comentar tal situação, pois não ia adiantar uma vez que era freqüente; …” (grifamos). A seguir, perguntas do procurador da autora à testemunha, com a respectiva resposta: “se chegou a ver Tarcísio abraçar ou beijar alguma empregada ou a própria autora? “ R: Sim, inclusive a autora. “se existia pressão da reclamada para que os empregados regularizassem suas situações?” “de que forma era feita a pressão? “ R: na frente de todos os empregados e aos gritos; quem fazia a manifestação era Tarcísio . Perguntas do procurador dos reclamados à testemunha, com a respectiva resposta: “se havia outros empregados atrás do armário no qual se localizava Tarcísio” R: geralmente quando Tarcísio atacava não havia outros empregados por perto, pois ele não era bobo. “se assistiu Tarcísio atacando alguém” R: sim . (grifamos). É corroborada por Nara de Fátima Lima Fortuna, fls. 480-481. Respondendo perguntas do procurador da autora: “Se houve alguma situação embaraçosa entre a depoente e Tarcísio?” R: sim, ele era um velho muito tarado e vivia beijando e assediando as pessoas e dando empurrões principalmente nas mulheres que não tinham esposo . Que Tarcísio deu vários empurrões na depoente. “Se presenciou alguma vez beliscando as nádegas de alguma empregada ou tendo alguma atitude indesejada com a autora?” R: sim, isto era comum. “Se as empregadas reclamavam para a chefe do setor as atitudes de Tarcísio?” R: sim, mas como ele era gerente geral, a maioria das pessoas tinha medo e se sujeitava, tendo em vista a dificuldade de arrumar emprego . “Se em alguma situação Tarcísio tentou fazer algo á força com a depoente” R: sim, estava sempre tentando. (grifamos). Não é diverso o depoimento de Cristiane Neves, fls. 481/482: “Se tem conhecimento de Tarcísio ter faltado com o respeito com alguma empregada ou ter assediado?” R: sim. “Se a depoente chegou a presenciar tais fatos? ” R: sim, várias vezes. “Inclusive com a autora? ” R: sim. “Se a empresa possuía uma lista dos empregados que estavam no SPC e se esta lista era mostrada par os demais empregados? R: sim e era mostrada para todos. “Se havia pressão para que os empregados saíssem do SPC? R: sim “Quem fazia pressão?” R: o gerente da empresa. “Se o gerente da empresa era Tarcísio Bandeira?” R: sim. (grifamos).
Outrossim, também respaldam a tese da reclamante os termos do depoimento da coordenadora, a quem se subordinava o gerente, Maria Zemira Bernardes, testemunha convidada pelos reclamados, fls. 482/483: “que conheceu Tarcísio; que não sabe de incidente que envolvesse Tarcísio e os demais empregados; …. que após a saída de Tarcísio os empregados da reclamada começaram a comentar que ele assediava e beijava as empregadas, normalmente os comentários eram oriundos dos empregados que saíam da empresa; …. se tivesse ouvido tais comentários durante o período em que Tarcísio trabalhava na empresa, não acreditaria; se a depoente visse os fatos imputados a Tarcísio, apenas acreditaria, mas não tomaria qualquer atitude, pois acredita que a atitude compete à pessoa assediada; se uma das empregadas assediadas viesse pedir ajuda à depoente, esta não sabe o que faria, não havendo qualquer orientação da empresa nesse sentido; …. se a depoente tivesse ciência de que as pessoas assediadas não estavam “dando entrada” a Tarcísio, a depoente comunicaria à diretoria;” (grifamos) Perguntas do procurador da reclamante: “Se viu Tarcísio beijar as empregadas?” R: sim, ele as beijava na cabeça, carinhosamente. “Se a depoente possui relação de amizade com Tarcísio?” R: não. “Se almoçavam juntos?” R: de vez em quando sim, juntamente com mais pessoas.” (grifamos).
Como visto, a superiora imediata de Tarcísio Bandeira não tomaria qualquer atitude, mesmo na hipótese de ser procurada por suas subordinadas queixosas, porquanto, como afirmou, essa atitude cabe à assediada. Paradoxalmente, a testemunha Luciana Fernandes, primeiro depoimento retro transcrito, conta ter sido desencorajada de tomar qualquer atitude pela sua encarregada de setor, muito provavelmente também subordinada à Maria Zemira Bernardes. Logo, se a empregada assediada deve tomar atitudes por si só, e não deve contar com respaldo algum da empresa, essa atitude somente pode se configurar como demissão. A perversidade é a tônica das relações contaminadas pelo assédio moral, e a presente situação se evidencia como tal. Há total aviltamento, no caso, na relação de trabalho, valendo-se o superior hierárquico dessa sua condição na empresa para suplantar, de forma perversa, a personalidade do outro e os direitos que lhe são inerentes. Nesse aspecto, os termos da brilhante exposição da MMª Juíza do Trabalho da 5ª Região, Bahia, Marcia Novaes Guedes, in Mobbing – Violência Psicológica no Trabalho, Revista LTr, Vol. 67, nº 02, Editora LTr, São Paulo, SP, 2003, pp. 162/165:
“Mobbing, assédio moral ou terror psicológico no trabalho são sinônimos destinados a definir a violência pessoal, moral e psicológica, vertical, horizontal ou ascendente no ambiente de trabalho. O termo mobbing foi empregado pela primeira vez pelo etiologista Heinz Lorenz, ao definir o comportamento de certos animais que, circundando ameaçadoramente outro membro do grupo, provocam sua fuga por medo de um ataque.
(…)
No mundo do trabalho, o assédio moral ou mobbing pode ser de natureza vertical – a violência parte do chefe ou superior hierárquico; horizontal – a violência é praticada por um ou vários colegas de mesmo nível hierárquico; ou ascendente – a violência é praticada pelo grupo de empregados ou funcionários contra um chefe, gerente ou supervisor hierárquico.
O terror psicológico no trabalho tem origens psicológicas e sociais que ainda hoje não foram suficientemente estudadas. Sabe-se, todavia, que, na raiz dessa violência no trabalho, existe um conflito mal resolvido ou a incapacidade da direção da empresa de administrar o conflito e gerir adequadamente o poder disciplinar. Por isso mesmo não se pode mitigar a responsabilidade dos dirigentes das organizações no exercício do poder diretivo. Tanto a administração rigidamente hierarquizada, dominada pelo medo e pelo silêncio, quanto a administração frouxa, onde reina a total insensibilidade para com os valores éticos, permitem o desenvolvimento de comportamentos psicologicamente doentes, que dão azo à emulação e à criação de bodes expiatórios.
(…)
A violência psicológica segue uma dinâmica identificada na qual o sujeito perverso emprega várias modalidades de agressões contra a pessoa.
(…)
Como sabiamente já deduziu o leitor, a vítima do assédio moral ou terror psicológico é violentada no conjunto de direitos que compõem a personalidade. São os direitos fundamentais, apreciados sob o ângulo das relações entre os particulares, aviltados, achincalhados, desrespeitados no nível mais profundo. O mais terrível é que essa violência se desenrola sorrateiramente, silenciosamente – a vítima é uma caixa de ressonância das piores agressões e, por não acreditar que tudo aquilo é contra ela, por não saber como reagir diante de tamanha violência, por não encontrar apoio junto aos colegas nem na direção da empresa, por medo de perder o emprego e, finalmente, porque se considera culpada de toda a situação, dificilmente consegue escapar das garras do perverso com equilíbrio emocional e psíquico para enfrentar a situação e se defender do terrorismo ao qual foi condenada. O dano pessoal, conforme a redefinição do dano moral – tese brilhantemente construída por Paulo Eduardo Vieira de Oliveira – é a conseqüência jurídica imediata que deflui da análise do fenômeno sob o ponto de vista da defesa dos direitos e interesses da pessoa humana.
(…)
O assédio moral é uma violência multilateral, tanto pode ser vertical, horizontal ou ascendente (a violência que parte dos subordinados contra um chefe), é continuada e visa excluir a vítima do mundo do trabalho, seja forçando-a a demitir-se, a aposentar-se precocemente, como também a licenciar-se para tratamento de saúde. O efeito dessa espécie de violência na vítima é devastador.
(…)
No mobbing, o agressor pode utilizar-se de gestos obscenos, palavras de baixo calão para agredir a vítima, detratando sua auto-estima e identidade sexual; mas diferentemente do assédio sexual, cujo objetivo é dominar sexualmente a vítima, o assédio moral é uma ação estrategicamente desenvolvida para destruir psicologicamente a vítima e com isso afastá-la do mundo do trabalho. A violência é sutil, recheada de artimanhas voltadas para confundir a vítima. Conforme dissemos, os métodos empregados pelo perverso assemelham-se largamente com aqueles utilizados pelos fascistas para submeter as vítimas e conduzi-las ao cadafalso sem um protesto. Heinz Leymann definiu o mobbing como a pior espécie de estresse social e designou-o de psicoterror.
(…)
Mobbing não é uma ação singular, também não é um conflito generalizado. O terror psicológico é uma estratégia, uma ação sistemática, estruturada, repetida e duradoura.
Em 1993, Heinz Leymann – considerado hoje o pai do mobbing – definiu o fenômeno como um conflito cuja ação visa à manipulação da pessoa no sentido não amigável; essa ação pode ser analisada em três grupos de comportamentos: um grupo de ações se desenvolve sobre a comunicação com a pessoa atacada, tendendo a levar a pessoa ao absurdo ou à interrupção da comunicação. Com ele ou ela se grita, se reprova, se critica continuamente o trabalho a sua vida privada, se faz terrorismo no telefone, não lhe é dirigida mais a palavra, se rejeita o contato, se faz de conta que a pessoa não existe, se murmura em sua presença, etc.
Outro grupo e comportamento se assenta sobre a reputação da pessoa. As táticas utilizadas vão das piadinhas mentiras, ofensas, ridicularização de um defeito físico, derrissão pública, por exemplo, de suas opiniões ou idéias, humilhação geral.
Enfim, as ações do terceiro grupo tendem a manipular a dignidade profissional da pessoa, por exemplo, como que para puni-la, não lhe é dado trabalho ou lhe dão trabalho sem sentido, ou humilhante, ou muito perigoso, ou, ainda, são estabelecidas metas de alcance duvidoso, levando a vítima a culpar-se e acreditar-se incapaz para o trabalho.” (grifamos)
Refere-se, ainda, o depoimento da testemunha Alexandre Peres de Oliveira, também convidada pelos reclamados, fl. 483, cujos termos demonstram tanto a gravidade e perversidade da situação quanto a insensibilidade daqueles já por demais expostos a ela: “que trabalhou junto com Tarcísio; que não viu Tarcísio agarrando as empregadas; que ouviu comentários que Tarcísio beijava a testa das meninas; os comentários não incluíam manifestação acerca do desejo ou não das empregadas serem beijadas; que Tarcísio nunca beijou a testa do depoente; acredita que nunca foi beijado por não ser mulher;….” .

Dessume-se do depoimento da testemunha Alexandre de Oliveira, convidada pelos reclamados que, para trabalhar para a empresa Losango a pessoa deve se submeter a muito mais do que a subordinação tratada no art. 3º da CLT. Tal situação não é normal e não é admissível e tampouco se coaduna com as exigências passíveis de serem feitas de empregador a empregado no âmbito do contrato de trabalho.
Nesses termos, não merece provimento o recurso dos reclamados.

2. Quantificação
Sucessivamente, os reclamados requerem a mitigação do valor da condenação.
A autora, a seu turno, requer seja majorada a condenação imposta, por não ter atingido patamar suficiente para atingir o caráter punitivo e pedagógico que se espera da medida.
O Juízo de origem fixou a indenização em R$ 5.000,00. Tendo em vista a remuneração outrora auferida pela autora, pode até se afigurar valor passível de apreciação.
Todavia, restaram totalmente esvaziados o caráter punitivo e o caráter pedagógico. A empresa Losango, integrante de grupo econômico capitaneado pelo Lloyds TSB Bank PLC, cujo capital social remonta ao banco em mais de 80%, efetivamente detém ativo realizável para fazer frente a indenizações muito mais vultosas sem comprometer em nada sua estrutura, seu patrimônio ou até mesmo a gestão de seus negócios. Assim, impende fixar a indenização num critério de razoabilidade e proporcionalidade, atendendo tanto o caráter punitivo e pedagógico como a satisfação da reclamante em ver indenizada, por não ser possível de resolver de outra forma, a angústia e sofrimento experimentados na relação empregatícia então mantida. Não que a dor seja quantificável – discussão antiga em se tratando de dano moral -, porém, tendo em vista a impossibilidade do retorno ao status quo ante, somente o pagamento de indenização é capaz de estender à parte lesada uma espécie de pequena compensação.
Tomamos como critério os parâmetros de valor jurisprudencialmente consagrados na seara das lesões aos direitos de personalidade. Nesse sentido, o seguinte aresto, oriundo do E. STJ, pretório que não apenas examina com mais freqüência a matéria, mas também é a última instância para discussão de valores de indenizações a tal título e, justamente por isso, norteia os valores a serem pagos em matéria de dano moral:
“De qualquer forma, se o caso é de reexaminar a fixação do valor, estou em manter a proposta do eminente Ministro Relator. Trata-se de um engenheiro, que dirigia a obra, objeto da contratação, impedido de exercer ato da sua profissão no cumprimento do contrato. Não se tratava de um simples técnico, mas de um administrador. Em razão disso, penso eu, deve ser especialmente ponderada a condição pessoal de quem sofreu o dano e, também, a causa que determinou a proibição, isto é, indevida e abusiva represália contra quem ousou deduzir em juízo a reclamatória trabalhista. Diante disso, e das condições pessoais do lesado, não vejo nenhum absurdo em que se atribua R$ 50.000,00 (cinqüenta mil reais) a título de indenização por ter sido o autor impedido não só de exercer a sua profissão, mas também de cumprir o contrato de terceirização.” (REsp Nº 309.725 – MA (2001/0029313-1), Excerto do voto do Exmo. Ministro Ruy Rosado de Aguiar, 4ª Turma, STJ, DJU 19.12.2002)

“No mais, é da jurisprudência deste Tribunal que o arbitramento do valor indenizatório por dano moral pode ser analisado em sede de recurso especial, desde que o quantum se mostre manifestamente exagerado, ou irrisório, distanciando-se das finalidades da lei.
A indenização por dano moral, como tenho assinalado por diversas oportunidades, deve ser fixada em termos razoáveis, não se justificando que a reparação venha a constituir-se em enriquecimento indevido, com manifestos abusos e exageros, devendo o arbitramento operar-se com moderação, proporcionalmente ao grau de culpa, ao porte financeiro das partes e, ainda, às suas atividades profissionais. Há de orientar-se o órgão julgador pelos critérios sugeridos pela doutrina e pela jurisprudência, valendo-se de sua experiência e bom senso, atento à realidade da vida, notadamente à situação econômica atual e às peculiaridades de cada caso.
A par destas considerações, e também em face dos pontos colocados em sentença (o ato praticado não teve reflexo direto de natureza econômica ou financeira, o fato ofensivo não teve ampla repercussão, além de que o autor foi demitido amigavelmente por sua empregadora), tenho que a quantia fixada pelo acórdão impugnado se mostra exagerada, notadamente em face dos precedentes deste Tribunal em casos mais graves. Assim, cuidando-se apenas de dano moral, tenho que fica bem para a espécie o valor de R$ 50.000,00 (cinqüenta mil reais), a ser corrigido a partir deste julgamento.”(REsp Nº 309.725 – MA (2001/0029313-1), Excerto do voto do Exmo. Ministro Relator, Sálvio de Figueiredo Teixeira, 4ª Turma, STJ, DJU 19.12.2002)
Examinam-se, portanto, as peculiaridades do caso. A reclamante era subordinada ao gerente, e este lhe fazia carinhos não solicitados e tampouco bem vindos, tanto que ajuizou a presente ação. Além do constrangimento de ter seu corpo manipulado por terceiro, no ambiente comum de trabalho e sem seu consentimento, era submetida a cobranças relativas à suas finanças pessoais, fato também reservado à sua esfera íntima. A atitude do gerente para com a reclamante, na condição de sua subordinada direta e empregada da empresa Losango, era de evidente assédio moral, concorrendo ainda a agravante de que a reclamante necessita do emprego para sua subsistência. De outra banda, a empresa Losango, com mais de 80% de seu capital social atribuído ao segundo reclamado é, a bem dizer, uma longa manus do Lloyds Bank, atuando na área de empréstimos pessoais e afins. Conta, portanto, com patrimônio mais do que razoável para fazer frente ao patamar de indenização fixado pelo E. STJ, em R$ 50.000,00 (cinqüenta mil reais).
Cabe referir o caráter punitivo e o caráter pedagógico da indenização arbitrada, razoável ao se considerar tratar-se de empresa da área financeira, integrante de grupo econômico liderado por banco como o segundo reclamado.
Dá-se provimento ao recurso da reclamante, no tópico, para elevar o valor da indenização por danos morais a R$ 50.000,00.
Nega-se provimento ao recurso dos reclamados.
(…)

1. Competência da Justiça do Trabalho.

Os reclamados renovam preliminar de incompetência deste Juízo para processar e julgar reclamatória onde a reclamante postula indenização por dano moral, pois não versa sobre relação de emprego. Requerem a extinção do feito sem julgamento do mérito, na forma do art. 267, IV, do Código de Processo Civil.

Sem razão.

A Constituição da República estendeu, na forma do art. 114, a competência desta Justiça Especializada para a solução de outras controvérsias, não importando a norma legal a ser aplicada, mas sim derivante da relação de emprego. Desta sorte, cabe a este órgão judicial a apreciação do dano moral alegado pela demandante na inicial, pois a mesma noticia como sendo responsáveis os reclamados, na condição de empregador e de responsável subsidiário, pela prática do ato ilícito declinado na exordial. A discussão, à vista disso, contida nos autos decorre do liame empregatício entre os litigantes. Ademais, não existe qualquer óbice afastando das “outras controvérsias”, mencionadas na referida norma constitucional, a questão do ressarcimento pretendido pela reclamante. Outrossim, o art. 652, IV, da CLT, concede à primeira instância poder para processar e julgar os demais dissídios concernentes ao contrato individual de trabalho, entre os quais se enquadra a reparação dos direitos de personalidade do obreiro ante a prática de ato ilícito cometido pelo empregador.

Mantém-se a rejeição.

2. Responsabilidade Subsidiária.

Sustentam os reclamados ser indevida a condenação subsidiária do segundo reclamado. Alegam não ter restado demonstrado o fato de estar uma das empresas sujeita a controle ou direção da outra, restando inatendido um dos requisitos postos no § 2º do art. 2º da CLT, e tampouco o fato de não ter a primeira reclamada, Losango, idoneidade financeira suficiente para fazer frente a eventual condenação. Acenam com o fato de ter sido a primeira reclamada quem contratou a autora, assalariando-a e promovendo a rescisão contratual, restando totalmente injustificada a condenação, neste particular.

O Juízo de origem concluiu pela existência de grupo econômico, nos moldes do § 2º do art. 2º da CLT, fundamentando pertencer a empresa Losango a grupo encabeçado por Lloyds TSB Bank PLC, especialmente tendo em vista a documentação juntada aos autos às fls. 24/30.

Correta a sentença.

Às fls. 24/30, consta a 51ª alteração de contrato social da empresa Losango. Consta na cláusula terceira, fl. 26, deter o Banco Lloyds TSB S/A 140.449 cotas-parte, de um total de 167.635, totalizando aproximadamente 83,78% do capital social da empresa Losango. É, portanto, o acionista majoritário, detendo poderes de mando quanto aos rumos da primeira reclamada e consistindo o gestor do grupo econômico. Nota-se, ainda, ter sido informado o cadastramento na RAIS do PIS da autora mediante documentação encaminhada toda pelo segundo reclamado, Lloyds Bank, e não pela primeira reclamada, Losango, como dá conta a petição da fl. 428.

Inócuo o fato de ter sido contratada, assalariada e despedida a reclamante pela primeira reclamada, porquanto não se está a cogitar de fraude à legislação trabalhista ou de vinculação empregatícia direta ao banco, e sim de mera responsabilidade subsidiária, cujos efeitos são puramente econômicos.

Mantém-se.

(…)

Ante o exposto,

ACORDAM os Juízes da 6ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região, preliminarmente, por unanimidade de votos, rejeitar a argüição de negativa de prestação jurisdicional. No mérito, por unanimidade de votos, dar provimento parcial ao recurso dos reclamados, para limitar a condenação ao pagamento de diferença de multa de 40% sobre os depósitos do FGTS aos valores apurados pelo contador, à fl. 447, item 1.4; para absolvê-la da condenação ao pagamento de devolução de descontos relativos aos tíquetes. Por unanimidade de votos, dar provimento parcial ao recurso da reclamante, para elevar o valor da indenização por danos morais a R$ 50.000,00; para condenar os reclamados ao pagamento de horas extras excedentes à oitava diária, a contar de 1º de novembro de 1995, acrescidas do adicional e dos reflexos deferidos no primeiro grau, sem prejuízo das condenações já impostas a este título. Valor arbitrado à condenação, em R$ 5.000,00 ora majorado para R$ 50.000,00. Custas provisórias ora aumentadas para R$ 1.000,00.

Intimem-se.

Porto Alegre, quarta-feira, 21 de maio de 2003.

Beatriz Zoratto Sanvicente – Juíza-Relatora no exercício da Presidência