Número Único: 01461-2002-000-03-00-3 br>
Tribunal Regional do Trabalho da Terceira Região br>
Processo: Ra – 17/02 br>
Data De Publicação: 17/01/2003 br>
Órgão Julgador: Órgão Especial br>
Juiz Relator: Exmo. Juiz Manuel Candido Rodrigues br> br>
Recorrente:Wagner Pereira Prado da Silva br>
Recorrido: Exmo. Juiz Presidente Do Trt – 3a. Região br>
Ementa: Verdade Metafísica – Verdade Física – Verdade Processual – Conquanto se torne paradoxal a existência dessas três espécies de verdade, o certo é que a própria filosofia e o direito como tais as admitem sendo certo, embora, que tanto a física, quanto a processual, são sempre medianeiras da metafísica (a única que, a rigor, por ser indestrutível, como tal pode ser considerada). No campo dos julgamentos, a verdade processual, ainda quando porventura não manifeste a metafísica, a esta se equipara, apenas, para efeito de segurança, na prática dos atos processuais. De qualquer forma, “a verdade é uma força nascida em qualquer parte e que, atravessando corações e espíritos, se projeta nos documentos e livros; é uma força que agita os tribunais e parlamentos, constrói e reconstrói estados, derruba e varre poderes; é uma força que penetra, invisível, nos templos, alcança os campanários, ganha espaços inatingíveis, e, em pleno zenit, domina os páramos indevassáveis”
(Gilberto Vidigal).
Vistos, relatados e discutidos os presentes autos, em que figuram, como Recorrente, Wagner Pereira Prado da Silva e, como Recorrido, o Exmo. Juiz Presidente do TRT da 3a. Região.
I – Relatório
Wagner Pereira Prado da Silva, qualificado no processo em epígrafe, apresenta Recurso Administrativo contra a pena de advertência que lhe foi imposta, à fl. 415, aduzindo, para tanto, que “está respondendo, como indiciado, em verdade, por tentar reagir a um assédio moral” pois que, na verdade, tal pena já lhe foi aplicada, de forma cumulativa, com a de censura, pelo próprio Diretor de Secretaria, com a concordância e apoio formal e direto da juíza da própria Vara na qual se encontra lotado; sustenta esta alegação no teor da “promoção” feita pelo diretor de secretaria, no Proc. 2676/01, “in litteris”: “verifica-se que houve desobediência pelo referido servidor às normas legais, provimentais e ao plano de trabalho/2002 traçado aos Oficiais de Justiça desta Unidade”; no caso, houve uma evidente indução em erro para aplicação da pena aqui recorrida; a Comissão designada para proceder ao exame e conclusão dos fatos imputados ao recorrente não procedeu, adequadamente, para emitir o “Parecer”, em que se funda a pena aplicada ao recorrente; este “juntou ao feito certidão comprovando que até o dia anterior ao da vigência do Provimento 05, de 24/09/2001, o Sr. Diretor de Secretaria da Vara de Pouso Alegre certificava estar ele absolutamente em dia com todas as suas obrigações”; “se o Diretor de Secretaria de Pouso Alegre decide de forma diferente daquela contida no Provimento do juiz Corregedor, é evidente que devem ser eles harmonizados no sentido de se aplicar este nos aspectos de conflito com aquele”; o recorrente agiu de acordo com o Provimento da Corregedoria, em vigor sendo que o mais deve ser debitado a “abuso de autoridade” do Diretor de Secretaria da Vara de Pouso Alegre, numa inexplicável atitude de “execração pública do recorrente, fazendo constar de reclamatórias entre partes, que discutem temas outros que não os “interna corporis”, antes mesmo do exercício do direito de defesa do servidor, reprimendas e advertências contra quem, futuramente, é processado apenas para ter tal pena já aplicada meramente homologada, como se processo servisse para este fim e não para aqueles que todos que oficiam no Judiciário bem o sabem”.
Requer o cancelamento e revogações de todas as medidas paralelas de penalizações, em face do “império da antipatia documentada no Ofício 889/A-02, em desfavor do recorrente, por parte da juíza titular Camila Guimarães e do diretor de secretaria José Henrique da Paixão Lisboa, praticando todos os atos possíveis no sentido de afastar o recorrente do convívio com o seu filho, o que não conseguiu fazer a sua ex-esposa, Marília, lotada naquela mesma Vara na companhia de seu irmão, também lá lotado a exercer funções de assessoria da julgadora quando no exercício do cargo para oficial de justiça estava designado”.
Pede, sobretudo, que, através de um exame isento dos fatos, se dê provimento ao presente recurso.
Este, em síntese, é o relatório.
II – Voto
1 – Do conhecimento do recurso
Conheço do presente recurso, enquanto que se encontra em conformidade com as exigências legais.
2 – Do “meritum causae”
§ A – Considerações preliminares
Superados, embora, os graves equívocos e atropelos verificados, neste processo e que vão desde o tratamento de réu (impropriamente dispensado, originalmente, a um simples denunciado e, por fim, a um mero indiciado), passando pela inexplicável nomeação de um defensor dativo (fls. 387 vol. III), em favor de quem, administrativamente processado, já constava com advogado regularmente constituído (ata de fl. 142 vol. I), culminando com a inexplicável oitiva do próprio denunciante, como testemunha (fls. 130 e 139/142 vol I) -, o certo é que a delicadeza daquele consiste menos em tais aspectos da ordem formal e mais nas polêmicas e enigmáticas razões que tentam justificá-lo (e, por conseqüência, através dele, instrumentalizar quanto nele abertamente sobressai: de imediato, destituir o indiciado de seu cargo de Oficial de Justiça “ad hoc” e, por fim, afastá-lo, definitiva e terminantemente, da Vara do Trabalho de Pouso Alegre, onde se encontrava lotado (ofício de fls. 72, conjuntamente assinado pela Juíza titular da própria Vara e pelo seu diretor de secretaria o último, conforme evidenciado, em todas as páginas dos autos, autor deste processo e do que, precedentemente, pelo mesmo foi aberto, junto da Corregedoria Regional, também contra o recorrente).
A esta altura, cumpre destacar que, conquanto a questão aqui controvertida ainda se encontre “sub judice”, conclui-se pelo histórico do processo que, na prática, aquele objetivo já foi alcançado restando-nos saber, então, até que ponto essa precipitação de fatos, aqui atacados, pelo recorrente, afinal, devem ou não ser ratificados por este sodalício.
Por isso mesmo é que, diante da decisão que embasa as penas aplicadas ao recorrente (de fls. 405 a 413 vol. III), da autoria de uma Comissão de funcionários, para tanto designada, agora que o recorrente retoma sua defesa, perante este Colegiado (segundo o mesmo, não só para que sejam anuladas as penas sofridas, mas, também, para que na condição de funcionário, com mais de vinte anos de carreira, “o Diretor de Secretaria seja compelido a se retratar de todas as promoções feitas em desfavor do Indiciado, de forma expressa e pública” e, “além disso, que lhe seja prontamente restabelecida a função comissionada FC 05 (defesa de fls. 403/404) reforçando, neste recurso, ainda, “in litteris”, que “requer, ainda, que sejam canceladas e revogadas todas as medidas paralelas de penalização do recorrente, tais como remoção ou lotações em locais outros que não em Pouso Alegre, já que isto ocorre na espécie e há, sim, império da antipatia Documentada no Ofício 889/A 02, em desfavor do recorrente, por parte da Juíza titular Camila Guimarães e do Diretor de Secretaria José Henrique da Paixão Lisboa, praticando todos os atos possíveis no sentido de se afastar o recorrente do convívio com o seu filho, o que não conseguiu fazer a sua ex-esposa, Marília, lotada naquela mesma Vara na companhia de seu irmão, também lá lotado e a exercer as funções de assessoria da julgadora quando no exercício do cargo para Oficial de Justiça estava designado” – (fl. 421), resta-nos concluir, afinal, a verdade processualmente estampada neste processo.
§ B – Quanto ao mérito, propriamente dito
Abstendo-nos, desde logo, de tecer quaisquer considerações sobre o aspecto impressivo do processo desde que, embora formalmente representado por três volumes, aparenta tratar-se de abundante material de sua instrução -, o certo é que, feito o seu cuidadoso manuseio, facilmente se conclui que tanto resulta mais da inexplicável multiplicação de repetidas cópias documentais, sem outro mérito senão o de concorrer para a suprema dificuldade em distinguir o que representa contribuição de prova, daquilo que a obscurece.
De qualquer forma, partindo-se da natureza da denúncia, originalmente feita, contra o indiciado de que o mesmo, como oficial de justiça “ad hoc”, foi negligente, no cumprimento dos mandados judiciais que lhe foram distribuídos -, desde que no exercício de uma função precária e comissionada, indaga-se, até que ponto, em nome e benefício da própria economia processual, não teria sido bem mais fácil proceder-se à destituição “ad nutum” daquele (evitando-se, assim, o profundo desgaste sempre causado por processos desta natureza).
Por outro lado e, ainda, no plano indagativo -, deparamo-nos com a seguinte e delicada questão, no plano da lealdade processual: uma vez que este processo foi instaurado, em 08/04/02 (conforme reza a promoção da fl. 60 Vol. I), tendo contado, anteriormente, com outro processo correicional, com igual finalidade, aberto pelo mesmo denunciante (no caso, o diretor de Secretaria da Vara de Pouso Alegre), e no qual consta, atestado pelo mesmo, junto da Corregedoria Regional, que o denunciado “deixou de cumprir diversos mandados sem causa justificada, inclusive não se dirigindo às cidades de Bom Repouso e Itapeva, localidades onde devia diligenciar” (teor da denúncia da fl. 165 vol. II), tanto suscita, no caso, os seguintes questionamentos:
a) Que razões teriam levado o denunciante a não atender o pedido de expedição de certidão, prontamente requerida pelo denunciado, sobre o seu desempenho funcional, para fins de produção de sua defesa, junto da Corregedoria enquanto que, a toda a evidência, as expressas na Certidão da fl. 287 (Vol. II), datada de 17/09/2001, deveras se tornam incompreensíveis (sobremodo, porque, na condição de denunciante, certamente dispunha de todos os dados estatísticos a respeito até porque arrolados, como objeto da própria denúncia que assina, à fl. 166, como principal autor)?
b) Por outro lado, “contrario sensu”, como poder compreender-se que, desde que provocado pelo juiz Corregedor, em 11/12/2001 (fl. 365 vol. II), para “informar sobre o atual desempenho funcional do servidor” (denunciado), acusando o recebimento da ordem, em 17/12/01, logo no dia seguinte (18/12/01), tenha satisfeito o que, com igual dever, deixou de cumprir, para com o denunciado, desde 17/09/2001?
Pior que o atraso no cumprimento de um dever imposto por lei, porém, mais difícil ainda se torna compreender o conteúdo do ofício/resposta pelo denunciante enviado ao Juiz Corregedor, aqui literalmente transcrito:
“Em resposta ao ofício no. 1524/2001, recebido em 17/12/01, venho informar a V. Exa. que o servidor, Wagner Pereira da Silva, vem cumprindo regularmente os mandados judiciais com dedicação, zelo, presteza e estrita observância aos prazos legais, nada havendo, no momento, que desabone sua conduta” (fl. 370 Vol. III).
Neste caso, partindo-se do pressuposto certo de que o denunciante, como servidor público ainda por cima, revestido do poder/dever inerente a um diretor de secretaria judicial, de sempre certificar a verdade -, jamais poderá prestar falsas informações a quem quer que as requeira (sobremodo, ao Juiz Corregedor, seu superior hierárquico), entre as duas versões contraditoriamente a este último dirigidas, conforme evidenciado no processo correicional, resta-nos saber qual delas, afinal, deve ser tida na conta de verdadeira a esta altura, ainda afastando a hipótese de que nenhuma delas como tal possa ser tomada.
Não bastasse a representação de tão dantesco quadro processual e outro, com motivos porventura ainda mais grotescos, se nos depara, neste processo: o denunciante, depois de ter prestado informações tão contraditórias ao próprio Juiz Corregedor, voltou à carga, contra o indiciado, com iguais acusações de descumprimento por aquele de prazos processuais só que, desta vez, com duas novidades dignas de nota: as denúncias passaram a ser dirigidas, diretamente, ao Exmo. Juiz Presidente do Tribunal, tendo como base de sustentação um “Plano de Trabalho dos Oficiais de Justiça”, de sua própria autoria, e pelo mesmo “promulgado”, em 07/02/2002, respeitante ao “período avaliativo de 31/10/2001 a 30/10/2002 (encontrado, inicialmente, às fls. 06/07 do processo e no qual consta um “de acordo” da Juíza titular da Vara).
Pelo visto, através deste “ato provisional”, o denunciante acabou pautando o “critério” de Avaliação dos Oficiais de Justiça neste processo, especificamente, transformado em ponto de apoio de todas as acusações promovidas contra o indiciado (e do que, por sua vez, inicialmente, decorreu a perda da função comissionada deste último, e a abertura deste processo disciplinar (fl. 60 vol. I).
Consumada, assim, a primeira pena decorrente da denúncia até aqui ainda controvertida.
Ao lado disto, nota-se, à fl. 73 (e, sobretudo, 80 Vol I) que o denunciante é autor de “Recomendações” dirigidas aos Oficiais de Justiça sendo que, na segunda, exclusivamente dirigida ao indiciado, em 21/11/2001 (contracenando, por sua vez, com o ofício dirigido ao Juiz Corregedor, em 18/12/01 fls. 370; Vol. III), naquelas “recomendando” ao denunciado que, “no recinto desta Secretaria, deverá se abster da prática de atos desta natureza e manter um comportamento urbano, sem tecer comentários dúbios e irônicos, evitando desta forma tumultuar o bom andamento dos trabalhos desta Unidade, sob pena de quebra da disciplina e da hierarquia”.
Pior: o teor do ofício dirigido ao Juiz Corregedor, encontrado à já citada fl. 370 (vol. III) atenta, frontalmente, contra o minucioso relatório produzido pelo próprio denunciante, em 22/08/2001, como peça de base de prova no processo correicional por ele movido contra o denunciado (fls.167/179 Vol III) que, diga-se de passagem (porém, sempre, em homenagem à verdade), acabou por contar com a parcial retificação do denunciante, através da fala produzida às fls. 361/364 (vol. III), datada de 05/11/2001, diante da defesa e documentos apresentados pelo denunciante, junto da própria Corregedoria!
A gravidade da situação estampada no processo, porém, não fica por aqui: sobressai, sobretudo, contra a Avaliação Funcional do denunciado, feita pelo denunciante e suas duas assistentes, (datada de 19/11/01, e autuada de fls. 76 a 78 – (Vol. I), com a seguinte agravante: no item 04 (da fl. 78 Vol. I), invoca-se, como “Justificativa de Avaliação”, a “conduta no período de 16/07/01 a 14/08/01 que ensejou a instauração do Processo Disciplinar TRT/SCR/169/01 junto à Corregedoria de Justiça (Pedido de Providências)”.
Precisamente, diante de tantas e tão graves contradições do denunciante (no caso, um diretor de secretaria de Vara, autor de denúncia, perante o seu próprio Juiz Corregedor posteriormente, contrariada, taxativamente, através do ofício da fl. 370), limitou-se este último a concluir, a respeito da Medida Correicional intentada, devidamente instruída – porém, ainda assim, sem desistência ou retratação do denunciante:
“Diante disso, não há providência alguma a ser tomada contra o Denunciado, tendo em vista que seu desempenho funcional no momento recebe os encômios do próprio denunciante” (fls. 372).
Isto, em 21/12/2001, relativamente a uma Medida Correicional protocolada, em 27/08/2001 (fls. 165) cujo curso, portanto, se processou, praticamente, por quatro meses.
Superado, aparentemente, este gravíssimo episódio, com a própria decisão correicional; gravíssimo inclusive, porque chegou a comprometer, indevidamente, a intervenção dos bons ofícios do próprio Juiz Corregedor -, surpreendentemente, voltou-se à carga, com iguais denúncias, contra o indiciado (desta vez, porém, conforme anteriormente ressaltado, tomando-se por encosto um “ato provisional” (? !), da autoria do próprio denunciante, baixado pouco mais de dois meses após a decisão correicional, – eis que, conforme já referido, é datado de 07/02/2002).
Precisamente, um mês após essa “instrução” do denunciante, de caráter tipicamente “regimental”, retomou-se uma seqüência de mais denúncias de descumprimento de prazos processuais, nas diligências de mandados judiciais só que, desta vez, não dirigidas ao Juiz Corregedor, porém, diretamente, ao Juiz Presidente do Tribunal (e, por outro lado, a maioria delas, assinadas por Juiz em exercício e, algumas, pela própria Juíza titular da Vara de Pouso Alegre todas elas, porém, movidas por promoções feitas em processos, da autoria do denunciante e de sua assistente Nilcéia esta, precisamente, a mesma que, com este último, também fez parte da Comissão de Avaliação do denunciado, encontrada à fl. 77 (Vol. I) do processo.
Enquanto que as mesmas acusações (de negligência funcional do denunciado, pelo descumprimento dos prazos judiciais), na Corregedoria, deram azo a um processo que perdurou de 27/08/2001 a 21/12/2001 (quatro meses, portanto), desta vez, porém, nota-se que o primeiro ofício/denúncia é datado de 08/03/2002 (fls. 02 Vol. I); e, mesmo sem qualquer consulta à Corregedoria, logo em 22/03/2002 (menos de quinze dias depois, por conseqüência), pelo Diretor-Geral do Tribunal foi proposta ao Juiz Presidente do Tribunal “a exclusão do servidor da função comissionada que ocupa e a instauração do competente Processo Administrativo Disciplinar, com o objetivo de promover a apuração da responsabilidade de Wagner Pereira Prado da Silva nos fatos narrados nos processos em epígrafe”.
Impressionado com esta última invocação (de “processos em epígrafe”), este relator, com certa dificuldade, acabou por concluir que, onde se lê “processos” deve ler-se ofícios (no caso, encontrados às fls. 02, 08, 15, 23 e 29 (do Vol. I), o primeiro dos quais, precisamente, datado de 08/03/02 – todos os cinco, portanto, longe de ser processos (não passando, por isso, de puras acusações meramente formais).
Certo mesmo, até aqui pelo que consta do processo -, é que o denunciado, sem o espaço legal do direito de defesa, e apenas em função dos cinco citados ofícios, perdeu sua função comissionada de Oficial de Justiça “ad hoc”.
Logo em seguida (em 11/04/02), em razão doutro ofício mais uma vez, também dirigido ao Juiz Presidente do Tribunal, conjuntamente, pela Juíza titular da Vara de Pouso Alegre e denunciante (fl. 72 Vol. I), ao argumento de “não ser do nosso interesse a continuidade da prestação de seus serviços (no caso, do indiciado) nesta Unidade e com o escopo de manter a boa ordem dos trabalhos da secretaria e a harmonia da equipe”, e que a “conduta de não observância das normas legais, provimentais e internas, sem justificativa formalizada, constitui, na verdade, um mau exemplo para os demais servidores, devendo, pois, ser repelida, sob pena de quebra de disciplina, da hierarquia e desagregações na equipe” (destacando, também, “ser impossível a sua permanência no serviço externo da secretaria”, e “inviável e inconveniente o mesmo exercer funções no âmbito interno da secretaria”; e salientando, por fim, que “sua ex-esposa e seu ex-cunhado trabalham também nesta secretaria internamente, cabendo frisar que a separação do casal foi litigiosa e que ainda persiste a discussão judicial sobre a partilha de bens”), tanto acabou resultando, logo a partir de 16/04/2001, no afastamento do cargo do denunciado, de acordo com os termos expressos na decisão da fl. 71 (vol I).
Pelo mesmo motivo da denúncia, foi imposta, assim, a segunda pena ao denunciado, de afastamento do exercício do cargo, por sessenta dias (Fl. 61 vol. I).
Instruído o processo, através de prova documental e testemunhal inclusive, com a inexplicável participação do denunciante, como testemunha , depois do compromisso deste “conforme a lei a dizer apenas a verdade”, e “que não é inimigo do réu”, nem “amigo da servidora Marília Vieira, ex-esposa do réu” (ata de fl. 139 vol. I), foi declarado que “confirma todas as promoções constantes nos autos assinadas por ele”; “que independentemente de pauta dupla, os mandados deveriam ser cumpridos no prazo legal (8 dias)”, e que “o sistema de pauta dupla está implantado naquela secretaria desde Fevereiro 2000, data em que o depoente assumiu a diretoria e em vigor até esta data” (fl. 140 Vol. I).
Na citada assentada, porém, acabou por referir aspectos deveras interessantes, para o esclarecimento deste intrincado caso: “que o réu recebeu a primeira recomendação pelo juiz presidente, feita em 20/02/2002” treze dias após, portanto, a “instrução” pelo próprio baixada e endereçada aos oficiais de justiça; “que todos os oficiais pedem dilação de prazo”; “que não pode afirmar com precisão se anteriormente ao plano de trabalho todos os oficiais cumpriam os prazos” o que, pelo menos no último caso, no mínimo, dá margem às seguintes indagações: se não sabe informar, quanto aos outros oficiais de justiça, sobre o cumprimento de mandados judiciais, como conseguiu sabê-lo, quanto ao por ele denunciado?
Por outro lado, se todos os oficiais pedem dilação de prazo, por que só o denunciado tinha que cumprir o prazo imposto pelo denunciante ainda que contra a faculdade do art. 8o., do Provimento no. 05, da Corregedoria Regional?
Mais: se, conforme assentado na ata de instrução deste processo (fl. 139 vol. I), juramentado, o denunciante ratificou “todas as promoções constantes nos autos assinados por ele”, contra o indiciado (isto em 05/07/2002), como explicar-se o teor do ofício da fl. 123 (vol. I), em resposta ao presidente da Comissão de Inquérito, em 12/06/2002, sobre recomendações feitas aos oficiais de justiça, constantes de atas correicionais, pelo mesmo assinado, e com a declaração de “que não houve qualquer recomendação por parte da Corregedoria, constante em ata correicional, relativa aos trabalhos desenvolvidos por todos os Oficiais de Justiça desta Secretaria, inclusive do Servidor Wagner Pereira Prado da Silva” (destacou-se)?
Afinal, se denúncias tinha a fazer, por dever de ofício, contra o denunciado, como compreender-se tamanha omissão, junto do Corregedor, nas próprias visitas correcionais, preferindo apresentá-las, diretamente, ao Juiz Presidente do Tribunal constituindo-se, assim, pela segunda vez, também, perante o último, em agente de graves e inexplicáveis contradições?
Para o indiciado, através da defesa que lhe foi propiciada pelo defensor dativo, à fl. 392 (Vol. III), “o que se pretende dizer é que, ou as acusações … estão equivocadas ou decorrem de perseguição”.
A propósito, deve salientar-se que, precisamente, através da defesa dativa de fls. 391/404 (Vol. III), numa específica e detalhada demonstração de dados fundamentais, de tal modo ficou demonstrado desta vez, junto da Comissão de Inquérito que eram inconsistentes as acusações agora feitas pelo denunciante, perante o Juiz Presidente do Tribunal que, no Relatório de Julgamento, textualmente, se reconhece: “Ao contrário do que afirma o defensor dativo (autos, f. 395/396) o indiciado excedeu o prazo legal/regulamentar para cumprimento do mandado 209/02. No que se refere aos demais processos, o procurador logrou êxito em comprovar que o indiciado cumpriu o seu munus” (fl. 411, in fine, Vol. III).
Resta-nos saber, neste caso, se tanto foi alcançado pelos outros quatro oficiais de justiça pois que, quanto a estes, nem o denunciante apresenta relatórios de confronto, no processo, muito menos a atribuição de avaliação de seu desempenho (o que, lamentável e inexplicavelmente, também não foi requisitado pela Comissão de Inquérito).
A dar-se crédito ao depoimento do Oficial de Justiça José Adelino Dantas, em seu depoimento de fl. 141, “não tem notícia sobre o descumprimento do plano de trabalho dos Oficiais por parte de nenhum deles” fazendo supor que, nesta declaração, também está incluído o indiciado. Disse mais: “que não recebeu do réu nenhum pedido de ajuda para cumprimento de mandados” (ata de fl. 141 Vol. III).
Mesmo assim, ainda que estampado no processo, à fl. 169 (Vol. II), que enquanto o denunciado cobria uma distância de 606 Km contra, apenas, 369, 349 e 465 dos demais; e reconhecido, pelo Oficial José Adelino Dantas, no depoimento prestado, perante a Comissão de Inquérito, “que todos os Oficiais cumprem mandados com carro próprio, que todas as áreas possuem trechos ruins de difícil acesso e que não se pode utilizar qualquer tipo de veículo dada a multiplicidade de tipos de caminhos, encontrados na região; que cumpria mandados na região de Monte Verde; que com a chegada do réu passou tal atribuição para o mesmo; que as estradas apresentam alto grau de dificuldade tal como para todo o restante da região; que ocorrência de períodos chuvosos aumenta ainda mais as dificuldades enfrentadas pelos Oficiais de Justiça” o certo é que nada disto foi levado em consideração, no julgamento daquele.
Diante, pois, do amontoado de contradições apresentadas pelo autor das denúncias (tanto junto do Juiz Corregedor, quanto do Juiz Presidente do Tribunal e da própria Comissão de Inquérito), incorreu esta em contradição, evidenciada na conclusão da fl. 412, de proposta de advertência do denunciado sobretudo, porque jamais a tal conclusão se poderia ter chegado, diante das considerações ali tecidas, tomando por base a existência de elogios na ficha funcional daquele e a constatação de descumprimento de prazo, de um único mandado judicial.
De qualquer forma, acabou por se consumar a pena de advertência do denunciado, conforme consta à fl. 414 (Vol. III), precedida da perda da função comissionada e de afastamento do próprio exercício de seu cargo o que, por sua vez, fez com que aquele, no recurso apresentado, chegue a afirmar que “a pena imposta na decisão de advertência, já foi aplicada, de forma cumulativa com a de censura, tudo aliado a uma espécie de execreção pública, tudo sob o império do exposto no item “a” – o assédio moral – o que permitiu ao Diretor de Secretaria praticar tais atos sob a concordância e apoio formal e Direto da Exma. Juíza daquela Vara, Dra. Camila” (fls. 419), e o que o leva a requerer, à fl. 421, inclusive, que “sejam canceladas e revogadas todas as medidas paralelas de penalização do recorrente, tais como remoções ou lotações em locais outros que não em Pouso Alegre, já que isto ocorre na espécie e há, sim, império da antipatia Documentada no Ofício 889/A 02 em desfavor do recorrente, por parte da Juíza Titular Camila Guimarães e do Diretor de Secretaria José Henrique da Paixão Lisboa, praticando todos os atos possíveis no sentido de afastar o recorrente do convívio com o seu filho, o que não conseguiu fazer a sua ex-esposa, Marília, lotada naquela mesma Vara na companhia de seu irmão, também lá lotado e a exercer funções de assessoria da julgadora quando no exercício de Cargo para Oficial de Justiça, estava designado”.
Por sua vez, em face da consulta pelo denunciado dirigida ao presidente da Comissão de Inquérito sobre seu destino, ao final do prazo de afastamento (fl.) e de vez que, por um lado, não pretende abandonar a carreira e, por outro, está impedido de voltar à Vara de Pouso Alegre -, notado que tal esclarecimento não se encontra nos autos, por este relator foi determinado a fl 431, que a tanto se procedem, acabou sendo informado, através da Certidão da fl 433, que aquele, atualmente, se encontra lotado na Diretoria do Serviço Administrativo (o que para nós acaba por significar que, além de ter perdido a lotação, em Pouso Alegre, ainda por cima dali foi removido).
Cinco punições, portanto, para a mesma falta imputada o que, portanto, além de atentar contra o sagrado princípio jurídico do “non bis in idem”, aqui atinge o extremo de atentar contra o mais grave do “non multidem”.
Só por isto, portanto, já razões sobrariam para anulação das penas injustamente aplicadas ao denunciado à exceção, evidentemente, daquela da perda de função comissionada de oficial de justiça “ad hoc” eis que, quanto a esta, em razão de sua própria natureza, até mesmo comporta a destituição, “ad nutum”, pelo Juiz Presidente do Tribunal.
Diante de tudo isto, o denunciante pede para que sejam anuladas estas e as demais penas por ele sofridas inclusive, a inexplicável “avaliação funcional” de fls. 76/78, feita pelo próprio denunciante, bem assim como todos os atos e moções que encontram no primeiro a autoria ou a cumplicidade.
Tal pedido decorre, necessariamente, da comprovada falta de isenção e de lealdade (funcional e processual) do denunciante, contra o indiciado, tanto nos julgamentos emitidos, quanto nas denúncias feitas e atos processualmente praticados, pelo primeiro, quer junto da Corregedoria Regional, quer perante o Presidente do Tribunal, quer mesmo diante da Comissão de Inquérito.
É que, em direito, tudo deve ser pautado pelo princípio da lealdade, ou mesmo da autoridade de que o agente eventualmente se reveste sempre no sentido de se evitar, quer o abuso de direito, quer o de autoridade (este último, segundo nos parece, ainda mais grave do que o primeiro).
Com efeito, conquanto de natureza analógica, em termos de gravidade, porém, o segundo acaba por sobrepor-se ao primeiro pois que se este se tipifica, simplesmente, pelo fato do titular do direito exceder-se, no seu uso, quanto aos limites que a este são impostos, tanto pelo seu fim econômico ou social, quanto pela boa-fé e pelos bons costumes (art. 187 do Novo Código Civil), certo se torna que, de outra parte, de qualquer forma, o agente considera-se revestido de uma legitimidade própria, a ponto de mais facilmente poder desculpá-lo no seu “modus agendi”.
Já o “abuso de autoridade”, por sua vez, além de partilhar dos mesmos e gravíssimos pecados, inerentes ao abuso de direito, deste se distingue, precisamente, enquanto que seu agente, não dispondo de uma legitimidade própria, mas delegada, no campo de sua atuação, ainda por cima indevidamente se serve da investidura num cargo ou função pública, que jamais poderá comportar desvios de conduta em regra, destinados a instrumentalizar objetivos pessoais daqueles que a tanto se arrogam (isto porque mais do que ao agente que de tanto usa, sobremodo, atinge a instituição em nome da qual se pratica).
Desde que a prova dos autos, globalmente considerada, faz concluir que a mesma acaba por beneficiar o denunciado, voltando-se contra o próprio denunciante, em face das gravíssimas contradições, através delas evidenciadas, relativamente aos atos praticados pelo segundo, no estrito cumprimento de seu delicado munus de chefe de secretaria judicial, – induzindo em erro, primeiramente, o Juiz Corregedor; em seguida, o Juiz Presidente do Tribunal e, por fim, a própria Comissão de Inquérito -, impõe-se-nos o dever de ofício de tanto dar ciência oficial aos dois primeiros, para os fins expressamente previstos em lei e absolvendo, por sua vez, o indiciado, das penas que lhe foram impostas, à exceção da perda da função comissionada de oficial de justiça “ad hoc”, enquanto esta comporta a destituição, inclusive, “ad nutum”.
Esta, para nós, a conclusão a que inexoravelmente se chega, através da verdade processual estampada nas páginas destes autos.
Por tais motivos,
Conheço do recurso e dou-lhe provimento parcial para, à exceção da perda da função comissionada de oficial de justiça “ad hoc”, cassar as demais penas e atos que atingiram o recorrente, nominadas na fundamentação deste voto.
Oficie-se aos Exmos. Juízes Presidente do Tribunal e Corregedor, quanto às atitudes processuais do denunciante contra o denunciado, para os fins previstos em lei.
FUNDAMENTOS PELOS QUAIS,
ACORDAM os Juízes do Tribunal Regional do Trabalho da Terceira Região, em sessão ordinária do Órgão Especial, à unanimidade de votos, em conhecer do recurso; no mérito, sem divergência, dar-lhe provimento parcial para, à exceção da perda da função comissionada de oficial de justiça “ad hoc”, cassar as demais penas e atos que atingiram o recorrente, nominados na fundamentação do voto, determinando sejam oficiados os Exmos. Juízes Presidente do Tribunal e Corregedor, quanto às atitudes processuais do denunciante contra o denunciado, para os fins previstos em lei.
Belo Horizonte, 06 de dezembro de 2002.
Márcio Ribeiro Do Valle
Presidente
Manuel Cândido Rodrigues
Relator