Quarta-feira, 17 de julho de 2024

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Meu nome é Luciene

Meu nome é Luciene

Meu nome é Luciene, moro em Minas Gerais.
Não me importo quanto a divulgação de meu nome,
ele é muito bonito foi minha mãe que escolheu.

Nascer chorando, todos nascem.
Viver chorando, todos vivem.
Mas a minha dor é só minha
E carregarei para o resto de minha vida.
Às vezes me pergunto por que não muda.

Sou negra, mãe solteira e agora acougueira.
Tenho domínio esta área, serviço que é de homens,
Poderia ser o meu orgulho, mas é minha insatisfação.
Só tenho ele para sustentar meus filhos.
Queria realizar minhas paixões: Lecionar e escrever.

Quando comecei, era caixa.
Quis aprender o oficio, fui explorada.
Me ensinaram tudo o que precisava saber sobre açougue.
Me bateram com palavras odiosas do qual não tenho coragem de dizer.
Pensei em meus filhos, por isso fiquei e aprendi me defender.

Um ano de sofrimento, o favor virou obrigação.
Por fim me deram um cargo de confiança
Já era gerente de um do açougue.
Não posso confirmar esta promoção, pois na carteira continuava caixa.
O real… Ah! o real….
Eu era açougueira, caixa, balconista, gerente e faxineira.
Uma enorme sobrecarga.
Patrão xingando, poucas vendas.

A minha luta começou aí.
Correr atrás dos clientes, não deixar a carne perder, ser higiênica, não deixar dinheiro faltar, não deixar venda cair, aumentar o lucro.
Só tinha hora de pegar, sem hora de largar.
Maldito horário de verão que veio só para aumentar minha jornada de trabalho.
Não pode ir embora sem antes vim a lua, as estrelas, o céu negro.

Meu filho conhece mais a noite do que o dia.
As vezes que me esperou,
As vezes dormiu sem esperar,
As vezes em minha angustia e desespero,
Eu o repreendi.
Diante das poucas vezes que pude vê-los,
Eu fui má.

Noites negras, escuras, prisão.
Quantas vezes não dormi tentado achar solução,
Para o comercio de meu patrão.
Que até então descansava em sua mansão.
A dengue que perfurava meu corpo e minhas vistas,
Me aquecia e esfriava ao mesmo tempo.
Nem assim tive perdão.

– Folga! Só na sexta-feira da paixão.- Assim disse o meu patrão.
O meu sangue ferveu de raiva, enfrentei meu patrão, cuidei de mim.
No outro dia percebi que eles precisavam de mim.
Aí fui feliz.
Até que um dia uma discussão tola me fez pensar.
E o patrão dizer:
– Se você não trabalhar aqui onde irá?
Fui subestimada.
– Se você não trabalhar aqui onde irá?
Fui humilhada, dependo deles para viver.

De baixos dos panos arrumei outro emprego de acougueira.
Desta vez num hipermercado do qual trabalho até o momento
Finalmente pude ter mais tempo para meus anjinhos.
As preocupações com o comercio acabaram.
Tudo o que tenho que fazer é cumprir meu horário e fazer o serviço direito.

Mas, nem tudo são flores.
Trabalho só com homens sendo eu a única mulher acougueira.
Tenho a satisfação de alguns clientes e colegas.
Alguns são grosseiros.
– Desde que as mulheres vieram trabalhar aqui isto virou um puteiro.
“Um puteiro”, foi o que disseram.

Isso quando não precisam de dizer que
Fico nervosa por falta de homens.
Quando também outra mulher diz que
Quem é dona de casa precisa de tempo maior para cuidar.
Só por que não tenho marido significa que não preciso de tempo maior?

As vezes queria nascer de novo e ter uma chance na sociedade.
Mas ela rejeita tanto, que acho que meu espírito não deva atrever voltar.
Hoje tenho dores no braço direito, sei que é ler, mas prefiro dizer que não é.
Sou muito nova para adoecer e pobre demais para me dar o luxo de sentir dor.
Sou extremamente nervosa, sem paciência, vivo no futuro e esqueço o presente.

Me sinto doente, para escrever isso me custou muitas lágrimas e dores no braço. Para mim vale a pena, pois tenho um sonho de poder escrever, ficou mais distante com essa dor, mas sei que alguém ira ler, esta é uma satisfação que ninguém paga. Só queria que muitos pudessem ler, lutar e escrever suas histórias.

 

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