Assédio moral nas organizações: estudo de caso dos empregados demitidos e em litígio judicial trabalhista no Estado da Bahia

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Resumo

A proposta deste trabalho é analisar o fenômeno conhecido como assédio moral com base nas teorias desenvolvidas por Hirigoyen (2001; 2002) e Barreto (2000), e a sua relação com casos de relatos sobre dano moral – diante da inexistência de julgamentos de causas trabalhistas sobre assédio moral nos Tribunais Regionais do Trabalho do Brasil, exceto o TRT-15ª Região e TRT-17ª Região – por empregados demitidos na Bahia por maus tratos, perseguições e humilhações no ambiente do trabalho, registrados como depoimentos nos acórdãos, atas e sentenças de processos judiciais trabalhistas do Tribunal Regional do Trabalho – 5ª Região. O termo assédio moral é recente no universo do trabalho, apesar de maus-tratos e humilhações serem praticados desde o inicio das relações trabalhistas, sendo intensificado nas atuais dias pela vulnerabilização a quem são submetidos os trabalhadores no contexto da globalização. Particularmente no Brasil, a herança cultural deixada pelo regime escravocrata tende a considerar o assédio moral como comportamento “normal” no cotidiano das organizações, dificultando as reações por partes das vítimas, bem como o seu reconhecimento pela Justiça do Trabalho.

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Assédio moral e responsabilidade das organizações com os direitos fundamentais dos trabalhadores: III Concurso de Monografias de Amatra II

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Introdução

O grande tema proposto – Responsabilidade Civil e Contrato de Trabalho no Novo Código Civil – é um mundo, vasto mundo, que, se explorado em toda a sua plenitude, dificilmente se conteria nos estreitos limites de uma breve monografia. Essa rica vastidão tem o mérito de facilitar o trabalho do pesquisador, já que é possível abarcar o tema tocando levemente naqueles episódios capazes de gerar dano e a conseqüente ação de reparação, durante a execução do contrato de trabalho. Exemplificativamente poderíamos citar o elenco de doenças ocupacionais e os acidentes de trabalho, quando verificado o dolo ou culpa do empregador C. Federal, art.7o, XXIX. Além dessas hipóteses poder-se-ia explorar o assédio sexual e a responsabilidade civil do empregador; a acusação leviana de justa causa; anotações desabonadoras na carteira de trabalho são outras tantas hipóteses capazes de abrir as portas dos tribunais para o empregado requerer ressarcimento por dano moral. Soma-se à dificuldade de conter todo o tema dentro das estreitas margens de uma monografia o fato de que pouco ou nada acrescentaríamos a uma abordagem dessa natureza, de vez que já existem no mercado editorial diversas e excelentes obras(1) cuidando da matéria, as quais, certamente, serão enriquecidas por seus autores com novas análises em face da entrada em vigor do Novo Código Civil. Bem pesados esses elementos e a nossa vontade de trazer à apreciação uma abordagem, se não inédita no conteúdo, pelo menos na forma, é que preferimos o atalho. Partimos, então, para o exame de um fattispecie – assédio moral – também conhecido como “mobbing” ou terror psicológico, que tem sérias implicações no que concerne à responsabilidade de empresas e organizações para com os direitos fundamentais do trabalhador. Pretendemos enfocar o fenômeno assédio moral no trabalho sob o ângulo da responsabilidade civil a partir do novo estatuto de direito privado Lei 10.406 de 10/01/02, mas discutindo os seguintes aspectos: o fenômeno crescente do poder privado e a proximidade do terror psicológico com o genocídio; a insuficiência das normas civis para tutelar os direitos individuais e do critério da autonomia privada para aferir a ilicitude dos atos; e a importância da teoria da “Drittwirkung” ou Eficácia Horizontal dos Direitos Fundamentais. Por fim, devemos evidenciar a possível relação entre a constitucionalização do direito privado e o modo pelo qual as pessoas jurídicas de direito privado estão se posicionando diante do desafiante tema dos direitos humanos e as implicações disso para as relações de trabalho.

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Lei federal nº 9455, de 7/04/1997, sobre tortura

CONGRESSO NACIONAL

Lei nº 9455, de 7 de abril de 1997.

O Presidente da República. Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:

Artigo 1º – Constitui crime de tortura:

I – constranger alguém com emprego de violência ou grave ameaça, causando-lhe sofrimento físico ou mental:
      a) com o fim de obter informação, declaração ou confissão da vítima ou de terceira pessoa;
      b) para provocar ação ou omissão de natureza criminosa;
      c) em razão de discriminação racial ou religiosa;
II – submeter alguém, sob sua guarda, poder ou autoridade, com emprego de violência ou grave ameaça, a intenso sofrimento físico ou mental, como forma de aplicar castigo pessoal ou medida de caráter preventivo.

Pena – reclusão, de dois a oito anos.

§ 1º – Na mesma pena incorre quem submete pessoa presa ou sujeita a medida de segurança a sofrimento físico ou mental, por intermédio da prática de ato não previsto em lei ou não resultante de medida legal.

§ 2º – Aquele que se omite em face dessas condutas, quando tinha o dever de evitá-las ou apurá-las, incorre na pena de detenção de um a quatro anos.

§ 3º – Se resulta lesão corporal de natureza grave ou gravíssima, a pena é de reclusão de quatro a dez anos; se resulta morte, a reclusão é de oito a dezesseis anos.

§ 4º – Aumenta-se a pena de um sexto até um terço:

I – se o crime é cometido por agente público;
II – se o crime é cometido contra criança, gestante, deficiente e adolescente;
III – se o crime é cometido mediante seqüestro.

§ 5º – A condenação acarretará a perda do cargo, função ou emprego público e a interdição para seu exercício pelo dobro do prazo da pena aplicada.

§ 6º – O crime de tortura é inafiançável e insuscetível de graça ou anistia.

§ 7º – O condenado por crime previsto nesta Lei, salvo a hipótese do § 2º, iniciará o cumprimento da pena em regime fechado.

Artigo 2º – O disposto nesta Lei aplica-se ainda quando o crime não tenha sido cometido em território nacional, sendo a vítima brasileira ou encontrando-se o agente em local sob jurisdição brasileira.

Artigo 3º – Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

Artigo 4º – Revoga-se o art. 233 da Lei n. 8.069, de 13 de julho de 1990 – Estatuto da Criança e do Adolescente.

Brasília, 7 de abril de 1997; 176º da Independência e 109º da República.

Fernando Henrique Cardoso
Nélson A. Jobim
(Publicado no DOU de 08 de abril de 1997).

Resolução do Parlamento Europeu sobre o assédio moral no local de trabalho

Resolução do Parlamento Europeu sobre o assédio moral no local de trabalho (2339/2001(INI))

O Parlamento Europeu,

– Tendo em conta os artigos 2º, 3º, 13º, 125º a 129º, 136º a 140º e 143º do Tratado CE,

– Tendo em conta as suas resoluções de 13 de Abril de 1999 sobre a modernização da organização do trabalho – uma abordagem positiva de mudança (1); de 24 de Outubro de 2000 sobre o Emprego – orientações para as políticas de emprego dos Estados-Membros em 2001 – relatório conjunto sobre o emprego de 2000 (2); e de 25 de Outubro de 2000 relativa à Agenda de Política Social (3),

– Tendo em conta as passagens relevantes das conclusões dos Conselhos Europeus de Nice e de Estocolmo,

– Tendo em conta o artigo 163º do seu Regimento,

– Tendo em conta o relatório da Comissão do Emprego e dos Assuntos Sociais e o parecer da Comissão dos Direitos da Mulher e da Igualdade de Oportunidades (A5-0283/2001),

A. Considerando que, segundo um inquérito efectuado pela Fundação de Dublim junto de 21.500 trabalhadores, 8% dos trabalhadores da União Europeia, ou seja, 12 milhões de pessoas, declaram ter sido vítimas de assédio moral no trabalho no decurso dos 12 meses precedentes, havendo, por conseguinte, que presumir que é muito superior o número de casos efectivamente existentes,

B. Considerando que a frequência da violência e do assédio no trabalho, fenómenos entre os quais a Fundação inclui o assédio moral, varia muito entre os Estados-Membros, devido, segundo a Fundação, ao facto de que os casos são pouco declarados em certos países, que a sensibilização é maior noutros e que existem diferenças de sistema jurídico e diferenças culturais; que a insegurança das condições de trabalho é uma razão essencial da frequência crescente da violência e do assédio,

C. Considerando que a Fundação de Dublim observa que as pessoas sujeitas a assédio moral são muito mais susceptíveis ao stress do que os trabalhadores em geral; que, segundo as constatações da Agência Europeia para a Segurança e a Saúde no Trabalho, o assédio constitui um risco potencial para a saúde que frequentemente leva a doenças relacionadas com o stress; que os dados nacionais sobre o assédio moral no trabalho repartidos em função do sexo não permitem, no entanto, segundo a Agência, estabelecer um quadro uniforme da situação,

D. Considerando que, segundo os dados de um Estado-Membro, o assédio moral é de longe mais frequente se o trabalhador está submetido a uma tensão elevada, forma de trabalho que é mais habitual entre as mulheres do que entre os homens e que aumentou consideravelmente no decurso dos anos 1990,

E. Considerando que, no conjunto, os estudos e a experiência apontam para uma clara relação entre, por um lado, o assédio moral no trabalho e, por outro, o stress ou o trabalho sob forte tensão, uma concorrência acrescida e uma segurança profissional reduzida, bem como uma situação laboral precária,

F. Considerando que entre as causas de assédio moral se podem citar, por exemplo, as deficiências de organização do trabalho, de informação interna e de enquadramento; que os problemas da organização que ficam durante longo tempo sem resposta fazem pesar uma grande pressão sobre os grupos de trabalho e podem desembocar na designação de “bodes expiatórios” e no assédio moral; que as consequências para as pessoas e para o grupo de trabalho podem ser consideráveis, da mesma forma que os custos para as pessoas, as empresas e a sociedade,

1. Entende que o assédio moral, fenómeno cuja verdadeira dimensão ainda não se conhece, constitui um problema grave da vida laboral e que é importante que os parceiros sociais lhe confiram uma atenção acrescida, incluindo novas medidas para o combater;

2. Chama a atenção para o facto de o crescente aumento dos contratos a termo e da precariedade do emprego, especialmente entre mulheres, proporcionar condições propícias à prática de diferentes formas de assédio;

3. Chama a atenção para as consequências devastadoras do assédio moral na saúde física e psíquica daqueles que dele são alvo – e consequentemente das suas famílias – e que frequentemente necessitam de assistência médica e psicoterapêutica, o que, de forma geral, os induz a ausentarem-se do trabalho por razões de doença ou os incita a demitirem-se;

4. Chama a atenção para a circunstância de diversos estudos apontarem para o facto de as mulheres serem mais frequentemente vítimas de fenómenos de assédio moral do que os homens, quer se trate de assédio vertical descendente (de um superior em relação a um subordinado) ou ascendente, de assédio transversal (horizontal) ou de assédio misto;

5. Chama a atenção para o facto de acusações falsas de assédio moral se poderem transformar num temível instrumento de assédio moral;

6. Sublinha que as medidas de luta contra o assédio moral no trabalho devem ser consideradas como um elemento importante dos esforços destinados a melhorar a qualidade do emprego e as relações sociais no local de trabalho; que contribuem também para lutar contra a exclusão social, o que pode justificar acções comunitárias e está na linha da Agenda Social Europeia e das orientações para o emprego;

7. Observa que os problemas de assédio moral no trabalho provavelmente ainda são subestimados em muitas partes da União e que uma série de argumentos justificam acções comuns a nível comunitário, por exemplo, o facto de ser difícil conceber instrumentos eficazes para prevenir e combater este fenómeno, de as orientações em matéria de luta contra o assédio moral no trabalho poderem contribuir para a estabelecimento de normas e ter uma influência nas mentalidades, e de as razões de equidade argumentarem igualmente em favor de tais orientações comuns;

8. Exorta a Comissão a ter igualmente em conta, na comunicação sobre uma estratégia comunitária em matéria de saúde e de segurança no trabalho e no reforço da dimensão qualitativa da política social e do emprego, bem como no Livro Verde sobre “a responsabilidade social das empresas” , os aspectos do ambiente de trabalho que são frequentemente considerados como sendo de ordem psíquica, psicológica e social, incluindo a organização do trabalho, e a apostar numa acção a longo termo, sistemática e preventiva no que respeita ao ambiente de trabalho – tendo em vista, nomeadamente, lutar contra o assédio moral no trabalho -, bem como a abordar a necessidade de uma iniciativa legislativa nesse sentido;

9. Exorta o Conselho e a Comissão a incluírem indicadores quantitativos referentes ao assédio moral nos indicadores de qualidade de emprego a apresentar ao Conselho Europeu de Laeken;

10. Exorta os Estados-Membros, na perspectiva do combate ao assédio moral e sexual no local de trabalho, a analisarem e, eventualmente, ampliarem a sua legislação vigente na matéria, bem como a examinarem e qualificarem de forma unificada a definição de assédio moral;

11. Faz questão de salientar expressamente a responsabilidade que cabe aos Estados-Membros e a toda a sociedade em matéria de assédio moral e de violência no local de trabalho, domínio em que entrevê o cerne de uma estratégia de combate a estes fenómenos;

12. Recomenda aos Estados-Membros que obriguem as empresas, os poderes públicos e os parceiros sociais a instituírem políticas de prevenção eficazes, a preverem um sistema de troca de experiências e a definirem procedimentos aptos a resolver o problema no tocante às vítimas, assim como a evitar que este se repita; recomenda, neste âmbito, que seja incrementada a informação e a formação dos trabalhadores por conta de outrem, dos efectivos que exercem funções de chefia, dos parceiros sociais e dos médicos do trabalho, tanto no sector privado como no sector público; no contexto deste regulamento, chama a atenção para a possibilidade de colocar uma pessoa de confiança no local de trabalho, à qual os trabalhadores se possam dirigir, se tal desejarem;

13. Exorta a Comissão a ponderar a clarificação ou extensão do domínio de aplicação da Directiva-Quadro para a Saúde e a Segurança no Trabalho, ou inclusivamente a elaborar uma nova directiva-quadro, enquanto instrumento jurídico de combate ao assédio e também como mecanismo de defesa do respeito pela dignidade da pessoa do trabalhador, da sua intimidade e da sua honra; neste contexto, sublinha a importância de prever acções sistemáticas e preventivas no domínio do ambiente de trabalho;

14. Sublinha que o conhecimento, incluindo a investigação, poderão ser facilitados e melhorados com estatísticas de melhor qualidade, e insiste no papel do Eurostat e da Fundação de Dublin nesta matéria; exorta a Comissão, a Fundação de Dublin e a Agência Europeia para a Segurança e a Saúde no Trabalho a tomarem iniciativas tendo em vista estudos aprofundados do assédio moral;

15. Sublinha a importância de um estudo mais aturado da incidência do assédio moral no trabalho e da sua relação com a organização do trabalho e com factores como sexo, idade, ramo de trabalho e profissão; requer que o estudo em causa inclua uma análise da situação específica das mulheres sujeitas a assédio moral;

16. Verifica que um Estado-Membro já criou regulamentação tendente a combater o assédio moral no local de trabalho e que outros acometeram a via que os levará a promulgar leis destinadas a reprimir o assédio moral, frequentemente com base no modelo da legislação criada para reprimir o assédio sexual; convida os Estados-Membros a debruçarem-se sobre os problemas ligados com o assédio moral no trabalho e a terem-no em conta nas suas legislações nacionais ou outras acções;

17. Exorta as Instituições europeias a constituírem um modelo no que respeita às acções de prevenção e de luta contra o assédio moral no trabalho no seio das suas próprias estruturas, bem como à ajuda e apoio aos indivíduos e aos grupos de trabalho, e, eventualmente, a preverem a alteração do estatuto dos funcionários, incluindo uma política de sanções adequada;

18. Verifica que as pessoas expostas a assédio moral a nível das Instituições Europeias beneficiam presentemente de muito pouca ajuda, e felicita, neste contexto, a Administração do Parlamento Europeu por ter criado, há muito tempo, um curso destinado às mulheres administradoras, consagrado à “Gestão no Feminino” , e, mais recentemente, um Comité Consultivo para o Assédio Moral (“Mobbing);

19. Apela a uma reflexão sobre a medida em que a concertação a nível comunitário entre os parceiros sociais pode contribuir para o combate ao assédio moral no trabalho, bem como a associar as organizações de trabalhadores a essa luta;

20. Apela aos parceiros sociais dos Estados-Membros para que estabeleçam entre si, e a nível comunitário, os seus próprios planos de combate ao assédio moral e à violência no local de trabalho, e para que efectuem um intercâmbio de experiências sobre os mesmos pautado pelo princípio das melhores práticas;

21. Recorda que o assédio moral comporta igualmente consequências nefastas para as entidades patronais, ao nível da rentabilidade e da eficácia económica das empresas, pelo absentismo que implica, pela diminuição da produtividade dos trabalhadores causada por estados de confusão mental e de falta de concentração e pelo pagamento de indemnizações aos trabalhadores despedidos;

22. Sublinha a importância de alargar e clarificar a responsabilidade dos empregadores no que respeita ao desenvolvimento de acções sistemáticas que conduzam a um ambiente de trabalho satisfatório;

23. Apela à realização de um debate sobre as formas de apoiar as redes voluntárias ou as organizações de luta contra o assédio moral;

24. Convida a Comissão a apresentar, o mais tardar em Março de 2002, num Livro Verde, uma análise detalhada da situação respeitante ao assédio moral no trabalho em cada um dos Estados-Membros e a apresentar seguidamente, o mais tardar em Outubro de 2002, com base nessa análise, um programa de acção contendo medidas a nível comunitário contra o assédio moral no trabalho, o qual deverá incluir um calendário de realização;

25. Encarrega a sua Presidente de transmitir a presente resolução ao Conselho, à Comissão, à Fundação para a Melhoria das Condições de Vida e de Trabalho e à Agência Europeia para a Segurança e a Saúde no Trabalho.

(1) JO C 219 de 30.7.1999, p. 37.

(2) JO C 197 de 12.7.2001, p. 68.

(3) JO C 197 de 12.7.2001, p. 180.