Devido ao número crescente de denúncias , o assédio moral preocupa hoje não só o empregado, mas também o empregador. Afinal, qual a diferença entre pressionar o funcionário por um trabalho mais eficiente e o assédio moral? E como precaver que os seus colaboradores não cometam o crime dentro de sua empresa? Uma fórmula exata não existe, mas o diálogo, o treinamento, a troca de informações e cursos com especialistas podem ser uma ótima saída para evitar o problema.
Inicialmente estudado a fundo pelo médico psiquiatria alemão Heinz Leymann, em 1984, o assédio moral começou a ser punido no Brasil apenas em 2001, com a lei editada em Iracemápolis, SP, que objetivou coibi-lo no serviço público. Entretanto, há quem defenda que ele é tão antigo quanto o trabalho, como explica a advogada Daniela Beteto do escritório Trevisioli Advogados Associados: “de acordo com alguns pesquisadores, o assédio moral sempre existiu. Sugere-se, inclusive, que seja tão antigo quanto o trabalho hierarquicamente organizado. A diferença é que as discussões e os trabalhos científicos em torno do tema ganharam ênfase na última década, atingindo seu ápice na atualidade, quando nos deparamos com situações cada vez mais graves de violação aos direitos fundamentais dos trabalhadores”.
Apesar de não existir nenhum critério para fixação da reparação por assédio moral, as indenizações têm variado de R$ 10 mil a R$ 2 milhões, levando-se em conta os critérios de razoabilidade, condição pessoal do ofendido, capacidade econômica do ofensor e a extensão do dano causado.
Mas, sem dúvida, o dano maior não é o financeiro e sim a imagem da empresa que pode ficar comprometida não só para o público como para o próprio mercado de trabalho. “O empresário sofre junto com o assediado. A empresa tem sua marca e seu nome empresarial denegrido e perde produtividade, porque o trabalhador doente não consegue produzir direito. Também, quando o funcionário tem que se aposentar ou ficar temporariamente afastado é o empregador que perde, pois além da indenização que terá que pagar decorrente do afastamento, ainda terá que contratar e treinar outra pessoa para colocar no lugar do trabalhador afastado, enfim, tudo isso são perdas”, esclarece o advogado, árbitro e palestrante Robson Zanetti, sócio de Robson Zanetti e Advogados Associados.
Prevenir o assédio moral é a ferramenta mais indicada pelos advogados para que a empresa evite pagar indenizações ou tenha a sua imagem denegrida. Isso pode ser feito através de informações para os funcionários sobre o assunto, treinamentos dos gestores e um canal aberto de diálogo.
Muitas empresas já começaram a tomar atitudes para evitar que o assédio moral aconteça entre os seus funcionários. “Tenho observado, com frequência, a preocupação dos empregadores em contribuir para que as práticas de assédio sejam identificadas e imediatamente coibidas. É crescente o cuidado de muitas empresas em orientar e disseminar a idéia de necessidade de manutenção de uma relação saudável e de respeito mútuo entre todos os colaboradores. Os superiores hierárquicos, que com mais frequência são apontados como ofensores, participam de cursos com especialistas em relações interpessoais para que desenvolvam de forma equilibrada a cobrança de resultados sempre com vistas a propiciar o desenvolvimento sadio de seus subordinados. Além disso, muitas empresas também contam com o apoio de profissionais do Direito para avaliar suas regras de procedimentos e adequá-las quando necessário”, conta Daniela Beteto.
Há, ainda, um projeto de lei estabelecendo multa de R$ 1 mil para cada empregado que não for informado e treinado para evitar o assédio moral. “As empresas não têm escapatória, mesmo que a multa não for aprovada quando o projeto virar lei, a empresa que não prevenir o assédio pagará indenização. O assédio é um problema organizacional e a empresa pode evitar, basta querer e contratar alguém competente para mostrar como isso se faz”, explica Robson Zanetti.
Entretanto, contratar um gestor adequado, hábil e capaz é ainda a melhor saída para evitar o assédio moral. “Um gestor deve saber ouvir, ter humildade para aprender com aqueles que fazem a política acontecer no real; deve estimular vínculos interpessoais que beneficiem a organização e, fundamentalmente, saber respeitar os diferentes pontos de vista dos trabalhadores. Se o seu dever enquanto chefe ou gestor é exigir produção dos seus subordinados, isso não pressupõe que deva destruir, massacrar e humilhar o outro. Ao contrario: deve refletir sua desordem intima como fruto da sua adesão incondicional a ordem imposta, o que o torna responsável por seus atos. Se não reflete o que faz, torna-se um carrasco, envenenado pela desrazão e loucura do processo produtivo”, afirma Dra. Margarida Barreto, médica ginecologista e do trabalho e pesquisadora do Núcleo de Estudos Psicossociais de Exclusão e Inclusão Social (Nexin PUC/São Paulo).
Assédio Moral x Exigência
“Assediar significa estabelecer um cerco e não dar trégua ao outro, humilhando, inferiorizando e desqualificando-o de forma sistemática e repetitiva ao longo da jornada de trabalho. São ataques verbais, gestuais, perseguições e ameaças veladas ou explícitas, que frequentemente envolve fofocas e maledicências. Ao longo do tempo, desestabiliza o trabalhador, atinge sua dignidade e moral e devasta a sua vida. Em países europeus é conhecido como Mobbing; nos Estados Unidos e Inglaterra como Bulling, Harassement e em nosso país como assédio moral ou terror psicológico”, conceitua Margarida Berreto, “para a Organização Internacional do Trabalho há assédio moral quando uma pessoa rebaixa o outro ou um grupo de trabalhadores, através de meios vingativos, cruéis, maliciosos ou humilhantes. Resumindo, poderíamos dizer que são críticas repetitivas e desqualificações constantes em que nada está certo por mais que o trabalhador se esforce para fazer e dar o melhor de si”.
Daniela Manetti Mesquita, advogada empresarial da Crivelli Advogados Associados, ressalva que o assédio moral possui requisitos para a sua existência, entre eles:
1) Repetição sistemática/Temporalidade: reiteração da conduta ofensiva ou humilhante, uma vez que, sendo este fenômeno de natureza psicológica, não há de ser um ato esporádico capaz de trazer lesões psíquicas à vítima;
2) Intencionalidade: intenção de ocasionar um dano psíquico ou moral ao empregado para marginalizá-lo em seu ambiente de trabalho;
3) Direcionalidade: uma ou mais pessoas são escolhidas como vítimas;
4) Dano psíquico (há controvérsia na doutrina e jurisprudência quanto à necessidade da existência deste).
As consequências do assédio são inúmeras para o empregado, como explica Margarida: “vão desde a destruição de sua vida profissional à desestabilização emocional, culminando com isolamento social, o afastamento por doenças como estresse pós-traumático, síndrome do pânico, ideações suicidas e até mesmo a morte por suicídio. Os trabalhadores dizem que hoje a pressão e humilhações que sofrem são piores do que o próprio ritmo de trabalho. Se um trabalhador é isolado dos seus colegas e seu chefe passa a não lhe cumprimentar, a não lhe passar tarefas e desqualificar tudo que ele faz, ao longo do tempo causará prejuízo psíquico e físico, originando doenças e transtornos. Isto degrada deliberadamente as condições de trabalho além de violar direitos fundamentais, tais como: a saúde, a dignidade, a identidade, a personalidade e a integridade pessoal”, afirma.