Pesquisa do Observatório Social realizada no ABN Amro, antigo Real, revela que o gênero e a cor influenciam a carreira dos funcionários nas instituições bancárias. Entre os 22.393 empregados do banco, só 9,7% são negros. O salário desse grupo não passa de R$ 2 mil.
A cor e o gênero influenciam as carreiras dos funcionários nas instituições bancárias. A constatação é de pesquisa feita no ABN Amro, antigo Real, pelo Observatório Social, organização ligada à CUT (Cental Única dos Trabalhadores). A realidade do ABN reflete a dos demais bancos, segundo a coordenadora do estudo, Márcia Miranda Soares. “A desigualdade de gênero e raça é uma realidade no setor bancário e financeiro”, afirma.
Entre os 22.393 funcionários do banco, apenas 9,7% são negros (pretos e pardos), de acordo com o relatório divulgado neste mês. Os negros também ocupam funções com salários inferiores – o teto máximo não chega aos R$2.000. A desigualdade é ainda maior nos cargos de chefia. Na diretoria não há nem negros nem negras e apenas 2% dos negros são gerentes.
As mulheres estão em quase igualdade numérica, apesar de a maioria ocupar funções menos remuneradas, como escriturarias ou atendentes. Elas também são discriminadas porque engravidam – algumas deixam de ser promovidas. Também são vítimas do assédio moral.
Iniciada em 2001, a pesquisa ouviu 68 funcionários, 12 dirigentes sindicais e 6 representantes do banco nas cidades de São Paulo (capital e interior), Rio de Janeiro, Belo Horizonte e Recife. O período de análise vai de 1998 – quando foram adquiridos o Banco Real e o Bandepe (Banco do Estado de Pernambuco) até junho de 2002.
A desigualdade dificulta também a promoção dos funcionários, principalmente entre as mulheres, porque as promoções são resultados, em parte, de um processo de avaliação individual e subjetiva feita pelos chefes diretos dos trabalhadores. “O alto grau de subjetividade dos avaliadores abre caminho para a reprodução da discriminação e manutenção das desigualdades contra mulheres e negros, mais ainda pelo fato de a maioria dos avaliadores serem homens brancos”, aponta o documento do Observatório Social.
O estudo é o primeiro a contar com a participação de representantes do banco e a traçar um perfil da relação trabalhista no setor financeiro. O Observatório Social tentou realizar, em 2001, pesquisa semelhante com o Banco Santander, que não quis participar.
Apesar de constatar que o banco não tem uma postura deliberada de discriminar trabalhadores sindicalizados e é aberto às negociações, o estudo aponta que vários pontos da Convenção Coletiva de Trabalho – que consta nas convenções da OIT (Organização Internacional do Trabalho) – são ignorados ou descumpridos pelo ABN.
Os principais são o desrespeito à jornada de trabalho, ao descanso nos finais de semana e pagamento indevido de horas extras. Soma-se a isso o estresse pelo cumprimento de metas.
Funcionária do Banco Real (atual ABN) há 17 anos, a caixa e também dirigente sindical de Bragança Paulista, Sandra de Oliveira, afirma que o quadro pode ser ainda “mais cruel” do que o apontado pelo relatório. “A pressão piorou muito com a atual conjuntura de desemprego e depois que o ABN assumiu o Real”, desabafa. Ela conta que chegou a ser suspensa por dois dias por ser dirigente sindical. “Queriam me mandar embora por justa causa”, diz.
Para o presidente da Confederação Nacional dos Bancários (CNB), Vagner Freitas, a pesquisa além de ser importante ferramenta e informação para aumentar as negociações e o diálogo entre a empresa e os trabalhadores, comprova também as denúncias já recebidas pelos sindicatos de bancários.
Ele admite que os programas de responsabilidade social e iniciativas do banco para diminuir as desigualdades são insuficientes. Isso porque, segundo ele, os bancos ainda devem muito à sociedade e aos direitos trabalhistas. “O muito que sugam dos funcionários não é devolvido à sociedade com geração de renda”, aponta.
Presentes à divulgação do relatório, as diretoras de responsabilidade social, Maria Luiza Pinto, e de recursos humanos, Lílian Guimarães, do ABN AMRO Bank reconheceram que o relatório aponta o “muito que ainda falta ser feito”.
No entanto, segundo as diretoras, o relatório é apenas uma fotografia de um momento no processo de desenvolvimento da empresa, que acaba por enfatizar aspectos negativos e omitir a evolução nos últimos quatro anos.
Como programas inovadores, o banco aponta o “Programa Diversidade”, para promover a igualdade no emprego entre os funcionários. Segundo a pesquisa do Observatório Social, alguns dados sinalizam para uma pequena melhoria no quadro geral das desigualdades, mas ainda não definem uma tendência. O estudo aponta que não houve participação dos sindicatos na definição desse programa e só recentemente dirigentes sindicais foram convidados a participar de sua implementação.
Maria Paola de Salvo – 30/06/2003